Lula no ataque contra Trump
Moralmente, Lula chega ao encontro com Trump de cabeça erguida
Importantíssima a entrevista do presidente Lula hoje na Indonésia, em que dá um balanço de sua visita ao país asiático, onde busca a ampliação das relações comerciais brasileiras com a Ásia, região que representa, neste momento, a vanguarda das relações globais multilaterais, deixando o unilateralismo imperialista para trás.
Daqui para frente, esse distanciamento entre o mundo multilateral e o carcomido mundo unilateral imperialista, em decadência acelerada, só tende a se ampliar.
Afinal, não faz mais sentido a continuidade do atraso imposto pela prepotência imperial, que se julga no direito de submeter à vontade do império o resto do mundo.
A sobriedade da entrevista de Lula se revelou como um verdadeiro puxão de orelha no presidente Trump ao discordar da ação do imperador americano de se lançar à barbárie dos tempos que a história humana já deixou para trás.
Não faz sentido, segundo o presidente brasileiro, um chefe de Estado ter como meta o assassinato dos adversários que elege ao seu livre-arbítrio, como é o caso do presidente Maduro, da Venezuela, eliminando venezuelanos e colombianos em águas territoriais no Caribe e no Pacífico, a pretexto de combater o narcotráfico, sob acusações que não podem ser comprovadas.
Como saber se se tratava de traficantes da Colômbia e da Venezuela, levando drogas para os Estados Unidos, se, antes de ter acesso a essa informação, manda a máquina de guerra americana exterminá-los, sem deixar rastros?
As relações internacionais, moldadas pelo avanço civilizatório, estabelecem que, antes de assassinar, é preciso prender e julgar, de acordo com as convenções definidas pela ONU e demais institucionalidades às quais a humanidade se rende para a resolução de contendas entre as partes.
A legislação americana, fruto do imperialismo unilateral, é um escárnio que a civilização condena, como se fosse prioridade sobre as demais legislações globais, no âmbito de cada país e nos sentidos estabelecidos pelas instituições internacionais, fruto do progresso moral dos povos.
Como nos velhos filmes de faroeste, Trump age como um xerife que chega matando e exterminando antes de conversar, sem estabelecer qualquer diálogo.
Rompeu com todas as regras de civilidade e, com isso, ameaça a estabilidade mundial, que ele já desorganiza com suas imposições imperialistas, especialmente em relação à América Latina, como se fosse dono do continente sul-americano, sem aceitar qualquer contestação.
Salta aos olhos o absurdo da prática trumpista de estabelecer ordem provocando desordem e insegurança latino-americana, como princípio imperialista de que está agindo em seu terreno, no qual ninguém, senão os Estados Unidos, dá as cartas, sem aceitar contestação.
Civilidade e moral lulista
A colocação tranquila, civilizada, diplomática e firme do presidente Lula sobre a barbaridade trumpista na Venezuela e na Colômbia, hoje, na Indonésia, deixou claro que se torna incontornável a discussão do assunto politicamente explosivo — porque está mexendo com a alma latino-americana — que ele tratará com o presidente Trump como um imperativo categórico.
Certamente, do ponto de vista brasileiro, o encontro entre os dois presidentes tem como foco essencial o tarifaço trumpista contra o Brasil, por razões absolutamente injustificáveis nas relações comerciais Brasil-Estados Unidos.
Não fazem sentido as imposições tarifárias de Trump de 50% sobre as importações de produtos brasileiros pelos Estados Unidos, simplesmente porque o histórico das trocas comerciais entre os dois países é vantajoso para os americanos, ao registrar superávit comercial de mais de 400 bilhões de dólares ao longo das últimas décadas.
Como brigar com um parceiro comercial que compra mais do que vende a seu cliente, a pretexto, como ficou claro na carta política de Trump a Lula, de exigir imediatamente a votação de anistia política para o ex-presidente Bolsonaro, coordenador da tentativa de golpe de Estado no Brasil, em 2023, por inconformidade com a derrota eleitoral em 2022.
Julgado soberanamente pela Justiça, o ex-presidente fascistóide foi condenado a 27 anos e três meses de prisão.
Trump exigiu a negação peremptória da lei brasileira, estabelecida pelo Congresso, na punição ao ex-presidente, como pré-condição para negociar a suspensão do tarifaço, ao mesmo tempo que utilizou a Lei Magnitsky para punir juízes brasileiros, impedindo-os de viajar aos Estados Unidos.
O presidente americano, com seu gesto insano, apenas despertou o sentimento nacionalista brasileiro que fortaleceu a defesa da soberania nacional, produzindo fato político relevante — o de tornar Lula favorito à disputa presidencial de 2026.
O tiro trumpista saiu pela culatra.
Trump, portanto, sofreu uma derrota acachapante no embate com Lula, porque deu lição de ditadura, enquanto Lula resistiu com o anteparo democrático que a Constituição brasileira lhe confere como defensor do interesse e da dignidade nacional.
A derrota moral trumpista ficou clara com a decisão de Donald Trump de abrir diálogo com Lula na reunião das Nações Unidas e, poucos dias depois, em telefonema cuja iniciativa tomou, ligando para Brasília a fim de trocar ideias com o chefe do Planalto.
Vitória da diplomacia brasileira
A diplomacia lulista, portanto, antes do encontro dos dois presidentes, previsto para acontecer no próximo domingo na Malásia, na reunião de cúpula da Asean — o novo fórum das relações internacionais decisivas, no âmbito do multilateralismo em ascensão — estabeleceu sua supremacia moral frente à prepotência imperialista.
Aos olhos do mundo, Trump se encontra com Lula como alguém que se comportou mal, agindo pretensiosamente, como se não houvesse barreira à ação exorbitante do império na busca intempestiva de alcançar seus objetivos pela força.
No ínterim entre o telefonema de Trump a Lula e agora, no encontro que ambos realizarão, ocorreu fato político mais grave: a decisão imperialista trumpista de acusar um presidente latino-americano de narcoterrorista e, por isso, lançar-se em guerra declarada contra Maduro, na Venezuela, em verdadeira exibição de força, mandando matar supostos traficantes — que, segundo observadores, não eram narcotraficantes, mas pescadores, trabalhadores latino-americanos, nas águas do Caribe.
Como provar a assertiva de Trump — do seu departamento de guerra, o novo nome do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, que carrega simbolismo sinistro — de que eram narcotraficantes os pescadores, se não sobrou nada para ser investigado e comprovado, depois das bombas lançadas contra eles, como se fossem meras execuções?
Simultaneamente, Trump coloca a CIA para supostamente derrotar, quiçá matar, o presidente Maduro, reinaugurando a antidiplomacia do porrete, para exterminar o regime bolivariano chavista revolucionário que busca outra opção política para uma América Latina independente.
Os Estados Unidos não aceitam que os venezuelanos se transformem nos responsáveis por seu destino político à revelia das ordens de Washington.
Os fatos extraordinários, que levaram o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, a sair na vanguarda da crítica ao imperador, agitando o mundo político latino-americano e se tornando, como Maduro, alvo de Trump, não deixaram outra opção ao presidente Lula senão antecipar, previamente na Indonésia, que o tema Venezuela fará parte das conversas dele com o presidente americano.
Trata-se, portanto, de um imperativo categórico moral abrir o assunto com o imperador, sob pena de o presidente brasileiro ser acusado de fugir do principal problema político continental, que desestabiliza a democracia latino-americana.
Se não abordar, de forma firme e determinada, a discussão do tema com o chefe da Casa Branca, Lula perde todas as condições morais de fazer valer a influência decisiva do Brasil como líder continental, dada sua extensão territorial, que o caracteriza como um sol a atrair planetas ao seu redor, graças à sua natural importância geopolítica.
Portanto, não há escapatória nem para Lula nem para Trump em recusar o debate desse problema capital, que marca indelevelmente as relações Brasil-Estados Unidos, tanto no plano comercial quanto no geopolítico, dadas as circunstâncias extraordinárias impulsionadas pelo imperialismo trumpista.
Moralmente, Lula chega ao encontro com Trump de cabeça erguida, altaneiro, enquanto o titular da Casa Branca, implicitamente, se expõe ao julgamento internacional, destituído de razão por agir intempestivamente, sem respeitar o direito de autodeterminação dos povos, num ambiente em que os Estados Unidos deixam de ser a nação hegemônica do mundo ocidental.
Resultado imediato da abordagem de Lula a Trump para suspender o tarifaço e atenuar sua agressividade imperialista à América do Sul será, consequentemente, maior aproximação Brasil–Venezuela e fortalecimento da posição brasileira de liderança política na América do Sul, como voz promotora da unidade latino-americana como forma essencial de enfrentar a brutalidade imperialista.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.



