Florestan Fernandes Jr avatar

Florestan Fernandes Jr

Florestan Fernandes Júnior é jornalista, escritor e Diretor de Redação do Brasil 247

241 artigos

HOME > blog

Fux, o silêncio imposto e a narrativa da extrema-direita

O fato é que o voto de Fux fortaleceu a narrativa da extrema-direita de que não houve tentativa de golpe nem organização criminosa liderada por Jair Bolsonaro

Luiz Fux (Foto: Rosinei Coutinho/STF)

O nervosismo manifestado pelo ministro Luiz Fux na terça-feira (9), durante o voto do relator Alexandre de Moraes, foi como um “apito de cachorro” para o que viria pela frente. Em duas ocasiões, Fux se pronunciou: na primeira, para antecipar que, em seu voto, no dia seguinte, trataria das preliminares; na segunda, para reclamar do aparte dado por Moraes ao ministro Flávio Dino:
“Só uma questão de ordem, presidente. Conforme nós conversamos naquela sala aqui do lado, os ministros votariam direto, sem intervenção de outros colegas. Muito embora tenha sido própria essa intervenção do ministro Flávio Dino, eu gostaria de cumprir aquilo que combinamos no momento em que eu votar”.

Ou seja, Fux queria manter um acordo que lhe garantisse falar tudo o que desejasse, sem interrupções, ainda que isso desrespeitasse os ritos do julgamento.

O sinal estava dado aos ministros da Primeira Turma e, sabe-se lá, a quem mais tivesse interesse no voto de Fux.

Na quarta-feira, por mais de 13 horas, Fux usou o plenário para desprezar de forma desleal o trabalho de mais de dois anos de investigação da Polícia Federal, o empenho de Paulo Gonet na elaboração minuciosa da denúncia apresentada pela PGR e o relatório sólido de Alexandre de Moraes.

Mais que isso, fez um voto que vai no caminho inverso do que ele próprio disse em 2023: “Os infames atos do dia 8 de janeiro entraram para a história como símbolo de que a aversão à democracia produz violência e desperta pulsões contrárias à tolerância, gerando atos criminosos inimagináveis em um Estado de Direito. O dia 8 de janeiro não merece data comemorativa, mas antes, repúdio constante, para que atitudes deste jaez não se repitam”.

Vale lembrar que Fux condenou mais de 600 réus do 8 de janeiro acusados dos mesmos crimes pelos quais Bolsonaro foi absolvido por ele.

Como se sabe, os processos na Primeira Turma seguem um rito claro, que prevê várias fases, dentre elas o recebimento da denúncia, que passa necessariamente pela decisão dos ministros. Em nenhum momento Fux contestou, por exemplo, a competência do STF para julgar a tentativa de golpe. Por que, então, resolveu levantar essa questão apenas em seu voto, sob a mordaça de um acordo que impediu reações de seus pares?

Só Fux poderá responder. O fato é que seu voto, com mais de 400 páginas, fortaleceu a narrativa da extrema-direita de que não houve tentativa de golpe nem organização criminosa liderada por Jair Bolsonaro. Como se o 8 de janeiro tivesse sido apenas um passeio de “black blocs” pela Praça dos Três Poderes. Como se os eventos que antecederam o “dia da infâmia”, como bem definiu a ministra Rosa Weber, fossem meras brincadeiras pirotécnicas.

Foi de virar o estômago ver Fux inocentar o núcleo central da trama golpista e condenar apenas o delator Mauro Cid e Braga Netto. Duro assistir ao ministro indicado por um governo progressista considerar natural bolsonaristas saírem de um acampamento em frente ao quartel de Brasília pedindo ditadura militar, para depois destruir e até “cagar”, literalmente, no plenário onde ele próprio exerce sua função de magistrado da mais alta Corte do país.

Como diria Caetano Veloso: “Será que nunca faremos senão confirmar a incompetência da América católica, que sempre precisará de ridículos tiranos”. Será que será!

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

Artigos Relacionados

Carregando anúncios...