Famigerada operação Condor volta agourar a América Latina?
Sem tratativas prévias entre governos, a cruzada de Trump contra cartéis promete instabilidade e um rio de desconfiança regional
Donald Trump anunciou em 2025, segundo o New York Times, uma ofensiva militar do Pentágono contra cartéis latino-americanos, rotulados como “organizações terroristas”. Não é apenas retórica inflamada: é um fósforo aceso sobre a soberania de México e Brasil. No Itamaraty, a cautela prevalece. A máquina bélica dos EUA não dança ao som de um único homem.
A proposta de Trump sacode o equilíbrio diplomático da América Latina, fragilizado após o governo Bolsonaro (2019-2022). A região, como um rio que guarda seu curso, teme ser palco de conflitos importados. A memória de intervenções passadas sussurra advertências, enquanto o Brasil resguarda sua soberania como quem protege uma chama na tempestade.
Os EUA têm um histórico de intervenções que moldaram o século XXI com promessas quebradas. A invasão do Afeganistão em 2001, contra a Al-Qaeda, custou 170 mil vidas, incluindo 46 mil civis (Costs of War Project), e terminou com o Talibã de volta em 2021. No Iraque, a mentira das armas de destruição em massa gerou 200 mil mortes civis (Iraq Body Count).
A ideia de Trump de enquadrar cartéis como terroristas segue esse roteiro perigoso. Classificar o narcotráfico como ameaça global pode transformar a América Latina em um novo tabuleiro de guerra. A história da região, marcada por cicatrizes de intervenções, não é um livro em branco, mas um alerta que ecoa.
Na década de 1970, a Operação Condor, apoiada pelos EUA, uniu ditaduras contra o “comunismo”, deixando 60 mil mortos e 400 mil prisões, segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. O Plano Colômbia (1999-2015), com US$ 10 bilhões, cortou 20% da produção de cocaína (ONU), mas deslocou 7 milhões de pessoas.
Esses precedentes são faróis na névoa. Intervenções americanas, sob o disfarce de combater o crime, amplificam o sofrimento humano. A América Latina, como uma árvore que resiste ao vento, carrega as feridas de um passado que ainda sangra, alertando contra novas cruzadas que prometem segurança, mas entregam caos.
A proposta de Trump ignora o direito internacional, que exige consentimento do Estado soberano. O México, com a voz firme de Claudia Sheinbaum, rechaçou em 2025: “Não haverá invasão.” A soberania, como um pássaro que resiste à gaiola, não se curva. O Brasil também rejeita classificar PCC e Comando Vermelho como terroristas.
O acordo militar Brasil-EUA, de 1952, renovado em 2020, permite cooperação, mas veta ações unilaterais em solo brasileiro. A história ensina com dureza: a invasão do Panamá em 1989 matou 500 civis (ONU) e gerou crises diplomáticas. No Afeganistão, US$ 2 trilhões não compraram estabilidade.
A ausência de um plano pós-guerra no Afeganistão é um castelo de areia desmoronado. A falta de consulta prévia em operações passadas minou alianças globais. A proposta de Trump, cega ao multilateralismo, ameaça repetir erros, transformando a América Latina em um palco de conflitos importados que ecoam como tambores na noite.
A reação global é de alarme. No México, analistas temem o fim da Iniciativa Mérida, que destinou US$ 3,3 bilhões à segurança desde 2008. O The Guardian alertou em 2025 para um “desastre importado”, evocando o Iraque. Na Argentina, o Clarín lembrou as sequelas da Operação Condor, enquanto o Chile teme desestabilização.
Na Ásia e na África, jornais como The Hindu e Mail & Guardian veem na proposta um desprezo pelo multilateralismo. O narcotráfico, com US$ 400 bilhões anuais (ONU), é uma hidra que não cai sob bombas. Soluções exigem acordos, não guerras que atravessam fronteiras como rios em cheia.
Trump enxerga os cartéis como alvos a serem abatidos, mas ignora a complexidade do problema. Sua estratégia, surda à diplomacia, ameaça desmantelar décadas de acordos. O Brasil, com olhos abertos, guarda sua soberania como quem protege uma chama. Se Trump insistir, o continente ficará preso às sombras de um passado que retorna.
A América Latina não é um tabuleiro de guerra. Suas nações, como pássaros que voam apesar das tempestades, jamais deixarão de voar, de resistir. Mesmo que as tempestades sejam aquelas criadas pela insensatez e embriaguez do poder.
A lição é clara: soberania não se negocia. Uma guerra sem consenso trará instabilidade, desconfiança e um legado de desgraças que atravessará gerações, como um rio que nunca esquece seu curso.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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