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Emir Sader

Colunista do 247, Emir Sader é um dos principais sociólogos e cientistas políticos brasileiros

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A marca mágica global do 'MAC'

O espírito de consumo foi se infiltrando nas relações da família, da religião, do sindicalismo, da educação, da cultura do ócio, do lazer, da própria política

Logo do McDonald's no Queens, em Nova York 17/3/2020 REUTERS/Andrew Kelly/Arquivo (Foto: Andrew Kelly)

O fordismo tinha difundido produtos padronizados, que foram substituídos por estilos de consumo baseados na variedade, que se tornaram critérios de competitividade das mercadorias. A indústria automobilística criou o paradoxo de modelos anuais de carros, como se fossem produtos de curta duração, mas isso se dá pelo culto ao novo, ao modelo mais moderno, à ostentação da capacidade de consumo dos mais ricos, que têm "o carro do ano".

Paralelamente, o marketing, a distribuição e a comunicação foram forjando novos instrumentos de busca de ampliação e de disputa dos mercados. Passou-se de uma economia centralizada na oferta a uma economia centrada na procura, na "política de marca", na "criação de valor para o cliente", nos sistemas de fidelização, na expansão da segmentação do mercado. É como se a empresa deixasse de agir em função do produto para agir em função do mercado e do consumidor.

Quando o consumo das famílias se torna o primeiro motor da economia, é fundamental instaurar um clima de confiança entre os consumidores, fazendo com que eles poupem menos e tomem mais créditos para gastar, para atender a seus sonhos de consumo. O acionista, por um lado, e o consumidor, por outro, passam a ser agentes fundamentais na era da economia neoliberal.

Para o consumidor, é fundamental "mercantilizar todas as experiências em todo lugar, a toda hora e em qualquer idade, diversificar a oferta adaptando-se às expectativas dos compradores, reduzir os ciclos de vida dos produtos pela rapidez das inovações, segmentar os mercados, fidelizar o cliente por práticas comerciais diferenciadas", segundo Gilles Lipovetsky.

O estilo de consumo do shopping center introduz um mercado baseado no consumo-mundo. Aos poucos, o espírito de consumo foi se infiltrando nas relações da família, da religião, do sindicalismo, da educação, da cultura do ócio, do lazer, da própria política, particularmente nas campanhas eleitorais. É como se o consumo funcionasse como um "império sem tempo morto, cujos contornos são infinitos", nas palavras de Lipovetsky. Quanto mais o consumidor se sente subjetivamente livre para definir o que ele quer, mais ele está sujeito às ofertas tentaculares do mercado.

Comprar ou visitar os lugares de venda passa a ser um ato de prazer, de fomento do desejo, da imaginação dos sonhos. "Se estimula a necessidade de consumir, a excitar o gosto pelas novidades e pela moda por meio de estratégias de sedução que prefiguram as técnicas do marketing. Impressionar a imaginação, despertar o desejo, apresentar a compra como um prazer, os grandes magazines foram, com a publicidade, os principais instrumentos da elevação do consumo à arte de viver e emblema da felicidade moderna", sempre segundo Lipovetsky.

Os grandes magazines trabalhavam para desculpabilizar o ato da compra, o "ir às compras" tornou-se uma forma de ocupar o tempo, um passeio, um estilo de vida para as classes médias, fazendo do consumo um ato de distração e de sedução.

As pessoas costumam dizer "Vou ao Mac", em vez de dizerem que vão comer tal ou qual hambúrguer oferecido por um comércio. Porque se trata da sensação de estar ali, submerso, subsumido a um universo da marca mágica do Mac.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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