A Lei Magnitsky contra a Venezuela é um arsenal de sanções para provocar instabilidade política e crise social
EUA declaram guerra a países que defendem soberania, socialismo e mundo multipolar
Por José Reinaldo Carvalho - Desde sua promulgação, a chamada Lei Magnitsky tem sido amplamente usada como instrumento de pressão política e econômica contra diversos países, em especial aqueles que mantêm políticas soberanas e resistem à hegemonia de Washington. A Venezuela, em particular, tornou-se alvo recorrente dessa famigerada peça legislativa elaborada nas “entranhas do monstro”, na feliz designação de Martí.
O país revolucionário bolivariano enfrenta severas sanções sob alegações de violação de direitos humanos, fraude eleitoral e corrupção. O caso venezuelano é uma ata de acusação ao imperialismo estadunidense, que usa a Magnitsky para estrangular a economia com finalidades políticas, quais sejam, a provocação de um ambiente de instabilidade, inquietação social, agitação artificial, guerra psicológica, tudo o que seja necessário para fomentar uma contrarrevolução e pôr o país de joelhos perante os imperialistas e os vassalos nativos.
O foco exclusivo da Lei Magnitsky, adotada em 2012, foi inicialmente a Rússia. Seu nome faz referência a Sergei Magnitsky, um advogado russo que morreu na prisão após denunciar um suposto esquema de corrupção envolvendo autoridades estatais. Em 2016, o escopo da lei foi expandido com a promulgação da Lei Global Magnitsky de Responsabilização pelos Direitos Humanos (Global Magnitsky Act), permitindo que o governo norte-americano impusesse sanções unilaterais contra qualquer cidadão estrangeiro acusado de corrupção ou abusos dos direitos humanos, independentemente da jurisdição em que os supostos atos tenham ocorrido.
A lei extraterritorial autoriza medidas como congelamento de ativos, proibição de entrada nos EUA e bloqueio de transações financeiras com entidades norte-americanas, afetando diretamente indivíduos e empresas em países sancionados.
Até hoje, a Lei Global Magnitsky foi aplicada a cidadãos de mais de 30 países, entre eles China, Rússia, Venezuela, Nicarágua, Irã, Síria (dos tempos de Assad), Coreia do Norte e Belarus. As justificativas apresentadas geralmente giram em torno da defesa dos direitos humanos, combate à corrupção, repressão política, censura e fraudes eleitorais, tudo tipificado segundo os critérios estadunidenses e aliados locais ou regionais complacentes ao seu domínio. As reações negativas, não só dos EUA, mas na América Latina e mundo afora à reeleição do Presidente Nicolás Maduro em 2024 foram eloquentes a esse respeito.
É fato notório que a aplicação da lei segue critérios altamente seletivos e politicamente orientados com fins nefastos, sendo em regra imposta contra países que por razões estratégicas ou circunstanciais o imperialismo estadunidense hostiliza, uma lei, portanto, que é um rematado instrumento de ingerência e coerção internacional, em contrariedade aos princípios da Carta das Nações Unidas.
A Venezuela tornou-se um dos principais alvos da Lei Global Magnitsky, no contexto da intensificação dos abusos cometidos pelos Estados Unidos, sob administração democrata ou republicana, para derrubar a Revolução. Dentre as autoridades sancionadas estão Nicolás Maduro, presidente da República; Delcy Rodríguez, vice-presidenta executiva; Diosdado Cabello, vice-presidente do PSUV e ministro do Interior, Justiça e Paz; Tarek William Saab, procurador-geral; Maikel Moreno, ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça; Oficiais das Forças Armadas, empresários, juízes e membros do Conselho Nacional Eleitoral.
As alegações que sustentam essas sanções incluem graves violações dos direitos humanos" durante os protestos violentos organizados pela oposição de extrema direita e respaldadas pelos próprios Estados Unidos em 2014, 2017 e 2019; corrupção sistêmica" envolvendo recursos estatais, como a PDVSA (Petróleos de Venezuela); "minar a democracia", "censura e repressão a opositores"; "fraudes eleitorais" em pleitos que, segundo os EUA, não teriam atendido aos “padrões democráticos”.
O governo da Venezuela, bem como numerosos juristas e especialistas em direito internacional, denunciam as sanções baseadas na Lei Magnitsky como medidas coercitivas unilaterais e ilegais, por não estarem autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU. Organismos como a Relatoria Especial das Nações Unidas sobre Medidas Coercitivas Unilaterais, liderada pela jurista Alena Douhan, afirmam que as sanções impostas à Venezuela configuram uma forma de "guerra econômica" e têm consequências devastadoras sobre a população civil.
Douhan alertou, em relatório publicado após missão ao país, que as sanções: "Afetam o funcionamento das instituições estatais, prejudicam os sistemas de saúde, alimentação e energia, e dificultam severamente as operações financeiras internacionais, inclusive para aquisição de medicamentos e insumos médicos."
Os efeitos econômicos das sanções impostas à Venezuela, em especial sob a égide da Lei Magnitsky, são graves e profundos. Entre os principais impactos destacam-se os ataques para destruir a renda petrolífera, com o bloqueio dos ativos nos EUA da PDVSA, estatal responsável por mais de 90% das exportações venezuelanas, cujos ativos foram bloqueados nos EUA e em países aliados; o impedimento a que a empresa realizasse transações em dólares e acessasse o sistema financeiro internacional, o que reduziu drasticamente sua capacidade de produção, exportação e manutenção. E confisco em 2019 da Citgo, filial da PDVSA nos EUA, privando a Venezuela de uma de suas principais fontes de receita externa.
As sanções cortaram o acesso da Venezuela ao sistema bancário internacional e a instituições financeiras, como o FMI, Banco Mundial, BID e CAF. Bancos e empresas internacionais passaram a se recusar a realizar transações com o país, por medo de sofrer sanções secundárias. O bloqueio de recursos em contas estrangeiras impediu o pagamento de medicamentos, alimentos e vacinas — mesmo durante a pandemia de Covid-19.
As sanções impostas pelo imperialismo estadunidense resultaram em queda do PIB, perda da capacidade de importação, desabastecimento, perda de poder aquisitivo e hiperinflação, especialmente entre 2017 e 2021. Houve fuga de capitais, sabotagem econômica, atentados contra instalações industriais e elétricas, impactando a produção e o fornecimento de serviços essenciais.
As sanções provocaram também a deterioração da infraestrutura, dificuldades econômicas para a população e afetaram enormemente a vida social, porquanto foram graves os impactos sobre o abastecimento, a saúde pública, a educação e a habitação. Apesar de tudo isto, o governo foi capaz de executar políticas públicas para minorar o sofrimento do povo. .
A aplicação da Lei Global Magnitsky contra a Venezuela evidencia o uso instrumentalizado do discurso de direitos humanos como pretexto para desestabilizar governos soberanos que desafiam os interesses hegemônicos dos EUA. Longe de promover a democracia e os direitos humanos, essas sanções buscam forçar uma mudança de regime e punir a Venezuela e seu povo por seu modelo de independência política, integração regional e orientação socialista.
Apesar da pressão, a Venezuela tem resistido e buscado alternativas com o apoio de aliados como China, Rússia, Irã e os países do BRICS, reforçando a construção de um mundo multipolar. O povo venezuelano, embora afetado, segue defendendo sua soberania diante de uma das mais cruéis formas contemporâneas de guerra: o bloqueio econômico seletivo e ilegal disfarçado de política democrática.
A denúncia da Lei Magnitsky como instrumento de agressão imperialista é, portanto, parte essencial da luta por um mundo baseado no respeito mútuo, na autodeterminação dos povos e na justiça internacional. Os que se opõem de maneira consequente ao imperialismo e defendem o direito internacional não podem se dar o desfrute de condenar a famigerada lei apenas quando ela atinge suas amizades eletivas e considerá-la válida quando com ela os Estados Unidos atacam governantes revolucionários arbitrariamente execrados como ditadores. Em nenhuma circunstância é dado aos democratas o direito de atribuir razão aos algozes e achincalhar as vítimas. Para defender o Direito Internacional, é indispensável ter critérios consistentes e coerentes com uma cosmovisão assente nos princípios e objetivos da luta pela autodeterminação de todas as nações e emancipação de todos os povos.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: