A fome como arma de guerra: Gaza no limite da barbárie
Quando o alimento vira isca e a fome, instrumento de dominação, a guerra ultrapassa todos os limites da moral humana
Enquanto o mundo discute diplomacias e acordos de cessar-fogo, em Gaza, as pessoas morrem por comida. A cena que se repete nas madrugadas é um pesadelo real: multidões famintas aglomeradas diante de centros de distribuição de farinha e lentilhas, alvos fáceis de tiros disparados por drones e tanques. A tragédia mais recente, ocorrida ontem, ao amanhecer de 20 de julho, deixou mais de 100 mortos - vítimas do que deveria ser um gesto humanitário: alimentar os que têm fome.
O exército israelense, ao justificar os disparos com a expressão “tiros de advertência”, revela a lógica desumana que rege esta guerra. Advertir com balas? Contra quem? Famílias inteiras em busca de pão? É impossível não ver aqui o uso da fome como arma de guerra. Um ato imoral que fere as convenções internacionais e agride o que nos resta de humanidade.
Relatórios da ONU alertam que 22% da população de Gaza caminha para uma catástrofe alimentar total. Em linguagem clara: fome em massa, deliberada, sistemática. Mais de 80% dos habitantes da Faixa já foram expulsos de suas casas. Vivem em tendas improvisadas, expostos ao calor extremo, doenças, falta de água e sem acesso a medicamentos básicos. A infraestrutura médica está à beira do colapso. Há pacientes entubados deitados no chão. Médicos sem insumos. Crianças com infecções tratadas com improviso ou nada.
Organizações humanitárias estão sendo forçadas a evacuar. Deir el-Balah, um dos últimos redutos para atendimento civil, está sob fogo cerrado. Alessandro Migliorati, diretor da ONG Gaza Emergency, descreve o cenário como uma carnificina. “É um massacre, sem ‘se’ ou ‘mas’”, afirma. Setenta mil pessoas ali estão sem saída. A proposta de realocação para a zona de al-Mawasi, já saturada e dominada por gangues armadas, não passa de um cruel cinismo.
A esta altura, o que se perpetua não é mais uma guerra contra o Hamas, mas o genocídio de um povo inteiro. Em 21 meses de conflito, mais de 58 mil palestinos foram mortos, a maioria civis. E enquanto isso, em Israel, a população também sofre: protestos em Tel Aviv pedem a libertação dos reféns e o fim da “guerra eterna”. A dor não tem lado.
Não há neutralidade possível diante da fome usada como política e como arma de guerra. Quem atira em civis famintos comete crime de guerra. Quem vê e se cala, compartilha da culpa e da responsabilidade. Não se trata nem sequer de tomar partido ideológico, mas de afirmar, com clareza moral: nenhum Estado tem o direito de transformar alimentos em armadilhas e crianças em alvos.
O mundo, inerte, assiste. Mas assiste até quando?
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