Tornado no Paraná pode estar entre os mais intensos já registrados no Brasil
Fenômeno atingiu velocidade superior a 250 km/h e expôs fragilidade da cultura de prevenção no país
247 - O tornado que devastou Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, pode figurar entre os mais fortes da história recente do Brasil. A análise é do geólogo e pesquisador Daniel Cândido, especialista em eventos meteorológicos extremos. Segundo ele, o país tem um histórico expressivo de tornados, figurando entre as regiões de maior risco no mundo.
De acordo com o g1, Cândido lembra que o Brasil “continua sendo a segunda área de risco mais intenso de ocorrência de tornados no mundo. Ela só fica atrás do chamado corredor dos tornados nos Estados Unidos”. Em sua tese de doutorado, defendida em 2012, o pesquisador catalogou 205 episódios do tipo entre 1990 e 2011 — incluindo o tornado de 1992 em Almirante Tamandaré (PR), que chegou à categoria EF3 e deixou seis mortos.
Condições geográficas favorecem formação de tornados
O especialista explica que a geografia da América do Sul é um dos principais fatores para a frequência dos fenômenos. “O motivo desse valor tão elevado na ocorrência de eventos está relacionado exatamente com a situação geográfica do país", afirma. O centro-sul do continente — que abrange Brasil, Paraguai e norte da Argentina — é uma região plana e aberta, onde o encontro de massas de ar é favorecido pela Cordilheira dos Andes, a oeste, e pela Serra do Mar, no litoral.
Essas barreiras naturais canalizam o ar e criam um corredor que intensifica a circulação atmosférica. “Essas áreas de baixa pressão aumentam a turbulência atmosférica, e quando o ar fica mais turbulento, você tende a ter intensificação de movimentos convectivos", explica o pesquisador. O resultado é a formação de tempestades severas e ciclones, especialmente nas regiões Sul e Sudeste.
Entre os casos históricos, Cândido cita o tornado que atingiu Paulínia e Jaguariúna (SP) em 1995, outro que devastou Indaiatuba (SP) em 2005 — com ventos de cerca de 250 km/h e destruição de 400 casas —, e a recorrência do fenômeno em áreas litorâneas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Tornado no Paraná atingiu nível 6 na escala de ventos
Com base nas imagens de satélite e nos danos observados em Rio Bonito do Iguaçu, o geólogo avalia que o tornado superou a marca de 250 km/h. Em sua tese, Cândido propôs a criação da Escala Brasileira de Ventos (Ebrav), com níveis de 0 a 7, adaptada à realidade climática do país. Segundo ele, o evento no Paraná seria classificado como nível 6, caracterizado por colapso de estruturas de alvenaria, arremesso de veículos e quebra de torres de energia.
Essa classificação colocaria o fenômeno entre os mais severos já documentados em território nacional.
Desigualdade e falta de preparo agravam impactos
Apesar de menos frequentes que na América do Norte, os tornados brasileiros têm potencial de devastação elevado, principalmente por causa da desigualdade social e da falta de políticas de prevenção. Cândido observa que, nos Estados Unidos, "as casas são predominantemente de madeira ou estruturas leves, o que as torna mais frágeis ao vento, mas mais fáceis de reconstruir".
No Brasil, o cenário é diferente. “As habitações são construídas em material mais pesado, como concreto e tijolo. Elas resistem mais, mas quando desabam, o impacto é muito maior".
Falta de cultura meteorológica
O pesquisador destaca que o país ainda está distante da cultura de prevenção presente nos Estados Unidos, atual líder mundial em monitoramento climático. “Lá, é comum ligar a TV e ver as condições do tempo logo pela manhã. As pessoas crescem aprendendo a acompanhar e confiar na meteorologia".
Cândido atribui essa diferença a dois fatores: educação e infraestrutura. “Eles têm uma rede de radares muito mais adensada que a brasileira, com cobertura praticamente total e dados acessíveis ao público. No Brasil, a burocracia para acessar informações meteorológicas muitas vezes dificulta a criação dessa cultura".


