Pagou, passou? Tiktoker de 16 anos é aprovada em Medicina com redação sobre si mesma
Júlia Pimentel conquistou vaga em faculdade privada do Rio com mensalidade de R$ 16 mil; professores analisam técnica usada em sua dissertação
247 - A influenciadora Júlia Pimentel, de 16 anos, foi aprovada em Medicina no Instituto de Educação Médica (Idomed), no Rio de Janeiro, e viralizou ao compartilhar a redação que garantiu sua vaga. O episódio levantou discussões sobre a validade de usar a primeira pessoa em textos de vestibular e pelos críterios usados pela banca. A mensalidade do curso é de R$ 16.253,00. A reportagem foi publicada pelo g1.
Com mais de 3 milhões de seguidores no TikTok, Júlia chegou a postar o vídeo celebrando a conquista, mas optou por apagá-lo após uma enxurrada de comentários irônicos sobre sua redação. Usuários chegaram a debochar, dizendo: “Você usou o ChatGPT Free ou pago?” e “Faltou começar com ‘Querido Diário’”. A jovem rebateu: “Falaram que eu fiz [o texto] sobre mim mesma. Sim, e eu amei isso. Consegui desenvolver a ideia muito bem. E estou superfeliz de ter feito jovens, mesmo que zoando, estarem falando de redação na internet. Amo influenciar as pessoas”.
A redação e o tema proposto
O vestibular online da Idomed pediu que os candidatos respondessem ao tema “Qual marca da sua personalidade ninguém roubará de você? Por quê?”. No texto, Júlia destacou a “determinação” como traço marcante de sua identidade. Ela obteve 29 de 30 pontos na redação e 30 de 70 na prova objetiva, resultado suficiente para ser aprovada.
Apesar da repercussão, professores de língua portuguesa afirmam que a escolha pelo uso da primeira pessoa foi adequada ao tema. “Só a 1ª pessoa daria conta deste tema”, explicou Margarete Xavier, professora do Fibonacci Educação. Daniela Toffoli, do Curso Anglo, concorda que a prova exigia subjetividade, embora avalie que o gênero textual estivesse mal definido: “Parece contraditório escolher dissertação. Seria mais adequado chamá-la de carta de apresentação”.
O debate sobre a simplicidade
O caso também reacendeu críticas sobre a facilidade de ingresso em faculdades privadas de Medicina. No vestibular da Idomed, a concorrência foi de cinco candidatos por vaga, muito inferior à de universidades públicas — na Unicamp, por exemplo, foram 265 candidatos por vaga em 2025. “O vestibular, com certeza, é um nível mais fácil. Mas não é simplesmente isso, assim, pagou, passou. Seria meu sonho, né? Mas você tem que passar por uma seleção”, disse Júlia.
Para Thiago Braga, gestor de Linguagens do Colégio pH, o tema simples não reduz a seriedade do processo. “Um tema por si, simples ou complexo, não é capaz de ser um definidor absoluto das habilidades e competências de um aluno para cursar uma faculdade”, afirmou.
Suspeitas de uso de IA
Nas redes sociais, alguns usuários insinuaram que Júlia teria usado inteligência artificial para redigir o texto. A jovem nega: “Fiquei muito feliz quando falaram que minha redação tinha sido do ChatGPT, porque [significa que] não tem nenhum defeito e que as palavras estão superbonitinhas. Mas, assim, zero”.
A Idomed informou que o vestibular é monitorado por webcam e fiscais em tempo real, e que os textos passam por ferramentas de detecção de plágio. A instituição destacou ainda que o objetivo do tema era avaliar “interpretação, argumentação, pensamento crítico e clareza de expressão”, sem exigir repertórios socioculturais complexos.