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"O governo tem que ser mais consequente no seu programa original", afirma Tarso Genro

Tarso Genro analisa desafios do governo Lula, Congresso e futuro da esquerda

(Foto: Ricardo Stuckert / PR | Divulgação )
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247 - Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o ex-governador do Rio Grande do Sul e ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, fez uma ampla análise sobre o atual cenário político brasileiro, as dificuldades enfrentadas pelo governo Lula e o futuro da esquerda no país. Durante a conversa, Genro apontou os desafios impostos pelo Congresso Nacional, a necessidade de reformas estruturais e a importância de uma nova estratégia de comunicação política.

Genro destacou que a recente eleição de Hugo Motta e Davi Alcolumbre para a presidência das casas legislativas representa um gesto de distensão política, mas alertou para a permanência de velhas práticas: "Eu não acredito naquilo que esses dois presidentes dizem. Sua história, sua postura e até os seus discursos mostram que representam a mesma coisa que o presidente da Câmara anterior representava". Segundo ele, apesar das mudanças políticas e econômicas, o governo federal enfrenta obstáculos que vão além da composição do Congresso.

O ex-ministro identificou três fatores centrais para os desgastes enfrentados pelo governo: o cenário internacional em mutação, a dificuldade em consolidar uma política de comunicação eficaz e a diversidade do ministério: "Tem pessoas de alta competência e relevância política, e tem pessoas novatas nas grandes questões do Estado brasileiro. Alguns ministros seguem tradições pouco compatíveis com as mudanças que precisamos fazer no Brasil".

A ameaça da extrema direita e o papel das Forças Armadas

Em um dos pontos mais incisivos da entrevista, Tarso Genro alertou para o impacto da ascensão da extrema direita global, mencionando diretamente Donald Trump e seus discursos nacionalistas e expansionistas. "Com sua postura em relação à Groenlândia, sua vontade de anexar o Canadá e outras ameaças, Trump impõe à América Latina a necessidade de discutir segurança continental". Segundo ele, a segurança nacional do Brasil está diretamente ligada ao fortalecimento da democracia e ao combate ao crime organizado, que hoje opera em redes transnacionais ligadas ao tráfico de pessoas, órgãos e biodiversidade.

Para Genro, é essencial que o governo Lula tenha uma postura firme na condução das Forças Armadas e proponha uma integração continental militar democrática: "É necessário que o governo aborde o papel das Forças Armadas, resgatando-as para um projeto democrático, com funções adequadas ao seu mandamento funcional. Precisamos de uma direção política firme para integrar as forças militares da América Latina em uma missão única".

O dilema do governo: compor com o Centrão ou fortalecer uma agenda progressista?

A respeito da governabilidade e da articulação política, Tarso Genro foi categórico ao afirmar que o problema do governo não é ser mais à esquerda ou mais ao centro-direita, mas sim manter coerência com seu programa original: "O governo precisa ser consequente no seu programa original. Isso pode ser feito dentro de uma posição centrista, progressista e democrática, com a liderança que Lula tem sobre o quadro político".

Segundo ele, o desafio central do momento não é apenas a governabilidade, mas a forma como o Congresso tem utilizado o orçamento para consolidar um sistema de chantagem política: "O grupo da extorsão orçamentária se tornou o elemento central da coalizão de extrema direita no Brasil, que cooptou a direita tradicional e formou um bloco majoritário. O que importa agora é como demolir esse bloco fisiológico que se apropriou da maioria dos recursos públicos".

Genro alertou que a tentativa de Lula de atrair setores mais conservadores pode acabar prejudicando a própria governabilidade: "Trazer indiscriminadamente para dentro do governo elementos vinculados a esse grupo é um tiro no pé. O presidente pode perder o controle do orçamento em definitivo e comprometer os anos mais importantes do governo".

A crise da esquerda e a necessidade de novas estratégias

Tarso Genro também discutiu a crise da esquerda e a desconexão com suas bases tradicionais. Para ele, as estruturas sociais que deram origem aos grandes partidos socialistas e progressistas se dissolveram com as transformações do mundo do trabalho: "Não adianta o PT achar que vai se escorar nos movimentos corporativos sindicais, porque a sociedade mudou. As demandas são outras, os trabalhadores são outros e as aspirações são outras".

O ex-ministro defendeu a implementação de novas políticas que dialoguem com esse novo cenário: "Não basta mais garantir três refeições por dia. O governo precisa formular programas que contemplem trabalhadores intermitentes e autônomos, instituindo fundos de proteção social para essa nova realidade".

Inflação e desafios econômicos

Sobre a questão econômica, Genro evitou fazer prognósticos definitivos, mas destacou que o governo tem instrumentos para enfrentar a alta de preços, especialmente dos alimentos: "O governo pode intervir na economia através do balizamento da taxa de juros, do aporte de infraestrutura e da integração regional. Além disso, pode controlar preços por meio de estoques reguladores de bens essenciais".

Ele ainda afirmou que as saídas para a crise exigem coragem e visão estratégica: "São saídas ousadas que precisam de um estadista para serem implementadas. E como acredito que Lula teve a coragem de realizar a transposição do São Francisco, acho que ele pode fazer isso novamente".

O manifesto Vamos em Frente e a mudança no CongressoPor fim, Tarso Genro falou sobre o movimento Vamos em Frente, que busca fortalecer uma articulação cívica para mudar a correlação de forças no Congresso Nacional: "Se não mudar, não tem país para ninguém. Pelo menos precisamos reduzir a extorsão orçamentária e o poder do Centrão sobre o Executivo".

Ele defendeu a necessidade de um movimento suprapartidário, capaz de reunir forças democráticas para barrar o avanço da extrema direita e recompor uma base progressista no Parlamento: "Nosso objetivo é formar uma frente política consistente, que pode ter dois ou três candidatos à presidência, mas que não reforcem a extrema direita e garantam a mudança da maioria no Congresso".

A entrevista de Tarso Genro evidencia os desafios políticos e econômicos do Brasil e reforça a necessidade de um governo que mantenha coerência com seu programa inicial, enfrentando as chantagens do Congresso e promovendo um novo pacto democrático para o país. Assista: 

 

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