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Mendonça adia cassação de governador após contrato entre Roraima e seu instituto

Pedido de vista do ministro do TSE suspende julgamento sobre uso de poder político e econômico nas eleições de 2022 em Roraima

Antonio Denarium e André Mendonça (Foto: Agência Brasil | STF )

247 - O ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça interrompeu, pela segunda vez, o julgamento que pode resultar na cassação do governador de Roraima, Antonio Denarium (PP). A informação foi publicada originalmente por Malu Gaspar, em O Globo. O processo, que trata do uso indevido do poder político e econômico nas eleições de 2022, estava prestes a ser concluído quando Mendonça apresentou novo pedido de vista, adiando o desfecho da ação.

O caso ganhou ainda mais repercussão porque a suspensão ocorre seis meses após o governo de Roraima firmar um contrato de R$ 273 mil com o Instituto Iter, empresa privada de ensino fundada por Mendonça e comandada por Victor Godoy, ex-ministro da Educação no governo Jair Bolsonaro.

Contrato e conexões políticas

A contratação do Instituto Iter foi assinada em 18 de fevereiro, pelo secretário de Licitação e Contratação de Roraima, Coronel Everson Cerdeira, e por Victor Godoy, que aparece como único sócio do instituto no cadastro da Receita Federal. O documento divulgado pelo próprio governo estadual prevê a capacitação de servidores públicos.

Nas redes sociais e no site do Iter, onde o perfil soma mais de 12 mil seguidores, Mendonça aparece como fundador e principal rosto da marca, que usa o slogan “conhecimento é o caminho” e se apresenta como uma instituição voltada à “capacitação para transformar profissionais e a sociedade”. O contrato teve duração de seis meses, com o valor integral já pago quando o ministro pediu vista pela primeira vez, em agosto.

Julgamento suspenso e consequências políticas

A ação contra Denarium — chamada oficialmente de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) — foi proposta pela coligação da ex-prefeita Teresa Surita (MDB), que disputou o governo em 2022. O governador é acusado de usar a máquina pública em benefício eleitoral, por meio da distribuição de cestas básicas, aumento de gastos com publicidade institucional e reformas em residências de eleitores durante o pleito.

A relatora do caso no TSE, ministra Isabel Gallotti, já havia votado pela cassação do governador e de seu vice, Edilson Damião (Republicanos), além de defender a realização de novas eleições em Roraima. Com o novo pedido de vista de Mendonça, o julgamento foi paralisado novamente.

O regimento do TSE prevê que um ministro pode reter um processo por até 30 dias, prorrogáveis uma única vez. O segundo prazo de Mendonça terminou neste sábado (1º), e, como não há nova prorrogação possível, a análise só será retomada quando ele devolver o processo. A interrupção, porém, pode adiar o julgamento para 2026, último ano do mandato de Denarium — que, por já ter sido reeleito, não poderá disputar novo cargo.

Origem e vínculos de Mendonça

André Mendonça foi nomeado para o STF em 2021 por Jair Bolsonaro, que havia prometido indicar um nome “terrivelmente evangélico” para a Corte. Antes disso, Mendonça ocupou os cargos de advogado-geral da União e ministro da Justiça durante o governo bolsonarista.

O Instituto Iter, fundado em 2024, oferece 24 cursos nas áreas do Direito e da gestão pública, com destaque para temas como licitações, contratos, arbitragem no setor público e programas de capacitação para prefeitos e gestores municipais. Em um dos cursos, intitulado “Prefeito do Século XXI”, Mendonça e o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Antonio Anastasia, ministraram aulas magnas.

Comparações no meio jurídico

Em Brasília, a criação do Iter é frequentemente comparada ao Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), fundado pelo ministro Gilmar Mendes antes de sua chegada ao STF. O IDP, atualmente administrado por um dos filhos do ministro, tornou-se uma instituição consolidada no ensino jurídico e na realização de eventos acadêmicos e políticos, como o Fórum de Lisboa, apelidado de “Gilmarpalooza”.

Procurado por meio da assessoria do TSE, André Mendonça não respondeu aos pedidos de informação sobre o caso. Enquanto isso, o processo que pode definir o futuro político de Antonio Denarium permanece parado — e sem data para voltar à pauta do tribunal.