Apostas ilegais ameaçam patrocínios e integridade do futebol brasileiro, alerta consultor
Estudo aponta que 51% da receita das apostas on-line no Brasil vem de empresas ilegais, tendência que pode se agravar até 2026
247 - O crescimento das apostas ilegais no Brasil pode causar um impacto significativo no futebol nacional a partir do próximo ano, com possíveis cancelamentos de contratos e queda no valor dos patrocínios. A projeção foi feita pelo consultor britânico Ismail Vali, CEO da Yield Sec, plataforma global de monitoramento do mercado de apostas, em entrevista ao ge, portal esportivo do Grupo Globo.
De acordo com o estudo “Brasil – mercado de jogos de azar on-line”, elaborado pela Yield Sec, as empresas ilegais já movimentam 51% da receita do setor, o equivalente a R$ 18,1 bilhões, superando as operadoras legalizadas, responsáveis por 49% (R$ 17,4 bilhões). Os dados se referem ao primeiro semestre de 2025, período que marca o início da regulamentação do mercado brasileiro de apostas esportivas e cassinos on-line.
Vali alerta que a expansão do mercado clandestino pode comprometer diretamente as finanças dos clubes. “Se chegarmos ao ponto em que mais de 60% do mercado for criminoso, você vai ver mais acordos de patrocínio sendo cancelados. Se chegar a 75%, metade do mercado de patrocínios pode desaparecer”, afirmou.
Segundo a análise da consultoria, a participação das empresas ilegais cresceu 10% entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano, e a projeção é de que atinjam 74% até o fim de 2026, caso nenhuma medida efetiva seja tomada. “No futuro, para empresas legais patrocinarem os clubes, o valor vai diminuir porque ninguém vai estar fazendo o dinheiro que deveria. Esse é o maior medo”, acrescentou o especialista.
Vali também criticou a lógica atual de muitos contratos esportivos. “Muitos acordos são impulsionados por ego. As companhias querem dizer que são a maior marca de bet do Brasil e que patrocinam os maiores clubes. Mas até quando vão fazer isso se não estiverem mais lucrando? O ego é afetado quando o dinheiro acaba”, disse.
Atualmente, todos os clubes da Série A do Campeonato Brasileiro são patrocinados por casas de apostas, sendo que 90% delas ocupam o espaço principal das camisas. Em agosto, o Flamengo anunciou o maior contrato do país nesse segmento: R$ 268,5 milhões com a Betano, superando em larga escala o acordo anterior com o banco BRB, firmado há cinco anos por R$ 32 milhões anuais.
Além do impacto financeiro, o avanço das bets ilegais representa um risco para a integridade esportiva, segundo o consultor. As empresas regularizadas devem reportar às autoridades qualquer suspeita de manipulação de resultados, o que não ocorre no mercado clandestino. “Há total falta de controle sobre integridade em bets ilegais. Se você tiver atletas corruptos, eles não vão usar as bets legais, em que tudo é reportado”, alertou.
O levantamento da Yield Sec identificou 167 operadores legais em atuação no Brasil no primeiro semestre, frente a 2.316 ilegais. Apesar do cenário preocupante, Vali reconhece avanços na regulamentação nacional. “O que descobrimos em seis meses de mercado legal é ótimo, uma das melhores performances que vemos internacionalmente. Mas com fundações muito frágeis. Se nada for feito, no ano que vem três quartos do mercado será criminoso”, avaliou.
Para conter o avanço das apostas ilegais, o Governo Federal vem adotando uma série de medidas. Em setembro, a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), vinculada ao Ministério da Fazenda, firmou um acordo de cooperação técnica com a Anatel e a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) para aprimorar a detecção e o bloqueio de sites clandestinos. Além disso, bancos e fintechs que operam como intermediários financeiros dessas empresas vêm sendo mapeados e investigados.