Desmatamento avança e ameaça o futuro hídrico do Cerrado, alerta pesquisador
O Cerrado já perdeu metade de sua área e pode sofrer queda de até 30% na disponibilidade de água até 2050, segundo Yuri Salmona, do Instituto Cerrados
Beatriz Bevilaqua, 247 - O Cerrado, a savana mais biodiversa do mundo, está sob ameaça. Metade de sua área já foi desmatada, e o desmatamento não apenas persiste, mas acelera, especialmente na região formada pelos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, nova fronteira agrícola do país. “O Cerrado é um bioma muito desprotegido. Enquanto na Amazônia o proprietário rural só pode desmatar 20% da área, no Cerrado ele pode desmatar 80%”, explica Yuri Salmona, fundador e diretor-executivo do Instituto Cerrados.
A situação tem efeitos diretos sobre a água, recurso essencial para cidades, agricultura e ecossistemas. Desde a década de 1970, houve uma redução de 27% na vazão de segurança dos rios do Cerrado. Projeções indicam que, até 2040 ou 2050, a disponibilidade de água pode cair mais 30%, intensificando conflitos e racionamentos. “O episódio da ‘Guerra da Água’ em Correntina, na Bahia, é emblemático. Estruturas de irrigação consumiam mais água que cidades inteiras, provocando revolta da população”, relata Salmona.
Além de monitorar o desmatamento e os impactos sobre a água, o Instituto Cerrados atua em educação ambiental, mobilização social e criação de unidades de conservação. “Estamos trabalhando junto a comunidades tradicionais e produtores rurais para conciliar produção com conservação. É preciso que todos compreendam que proteger o Cerrado não é só uma pauta ambiental, é uma necessidade estratégica para a economia, segurança hídrica e climática do Brasil”, afirma o especialista.
Segundo Salmona, a proteção hídrica depende de políticas públicas eficazes, fiscalização rigorosa e engajamento da sociedade. A instituição desenvolveu estudos e plataformas para indicar áreas prioritárias para conservação e restauração, apoiando decisões de governos e empresas. “Mais do que ciência, precisamos de ação coletiva. Cada cidadão, cada gestor público, pode contribuir para garantir água de qualidade e um futuro sustentável”, reforça.
O Cerrado também é vital para o abastecimento de grandes bacias hidrográficas. “93% da água do São Francisco, 100% do Parnaíba e do Pantanal, e 40% do Paraná têm origem no Cerrado. Sem ele, toda a cadeia econômica e ecológica do país sofre”, alerta Salmona.
A mensagem do Instituto é clara: preservar o Cerrado é preservar a vida. Ciência, políticas públicas e participação da sociedade devem caminhar juntas para evitar que o coração das águas do Brasil se torne apenas uma lembrança do passado.
Assista à entrevista na íntegra: