Brasil registra segunda maior queda histórica nas emissões de CO₂ com redução de 17%
Combate ao desmatamento impulsiona resultado que fortalece posição do país na COP 30, apesar de desafios em outros setores
247 - O Brasil alcançou entre 2023 e 2024 a segunda maior redução anual de emissões de gases de efeito estufa de sua história, com queda de 17%. O total passou de 2,58 bilhões para 2,15 bilhões de toneladas de dióxido de carbono (CO₂), impulsionado principalmente pelo recuo no desmatamento. Os dados, divulgados pelo Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), indicam uma conquista significativa para o país que sediará a COP 30 em 2025, na Amazônia.
De acordo com o jornal O Globo, o levantamento do SEEG — projeto independente mantido pelo Observatório do Clima — tem ganhado peso político por oferecer informações mais recentes que as oficiais, cujo inventário do governo federal ainda se restringe a dados de 2022. Embora as emissões ligadas à agropecuária, indústria, resíduos e energia tenham se mantido estáveis ou crescido, o controle do desmatamento foi determinante para a queda geral.
Fogo e contradições ambientais
A redução nas emissões, contudo, ocorre em um ano marcado por uma explosão de queimadas. O SEEG aponta que os incêndios de 2024 liberaram 441 milhões de toneladas de CO₂, volume quase equivalente ao das emissões provenientes do desmatamento. “As emissões por incêndios florestais, que não são contabilizadas no inventário, vieram num ano dramático em que o Brasil inteiro queimou e aumentaram duas vezes e meia”, explica Bárbara Zimbres, cientista do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Segundo ela, “a boa notícia é que 2025 não está sendo assim”.
A ONU não exige que o Brasil contabilize as emissões de incêndios em seus relatórios oficiais, sob o argumento de que florestas degradadas podem se regenerar e reabsorver o carbono. Entretanto, o aumento da frequência e intensidade do fogo nos biomas brasileiros pode colocar essa premissa em xeque.
Projeções e metas climáticas
O relatório do SEEG também apresenta uma projeção menos otimista para 2025. A expectativa é de uma nova queda modesta — cerca de 50 milhões de toneladas a menos que em 2024 —, mas insuficiente para atingir a meta estabelecida pela Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), compromisso oficial do Brasil junto à ONU. A previsão é de que o país feche o próximo ano com 1,44 bilhão de toneladas líquidas de CO₂, ultrapassando o limite prometido de 1,32 bilhão.
O número “líquido” considera as remoções de carbono pelas florestas em crescimento, metodologia apelidada de “pedalada florestal”. Apesar de criticada por cientistas, essa prática é aceita pela Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) e inclui áreas de conservação e terras indígenas presumidamente livres de desmate.
Redução histórica e desafios diplomáticos
Mesmo com ressalvas, a conquista reforça o papel do Brasil nas negociações climáticas internacionais. “Essa é uma queda expressiva, porque nenhum país do G20 ou entre os dez maiores emissores chegou nem perto desse nível de redução”, afirma Márcio Astrini, secretário-geral do Observatório do Clima. Ele destaca, contudo, que o avanço pode ser ofuscado pela decisão do governo de liberar a exploração de petróleo na Margem Equatorial — medida vista como um revés ambiental às vésperas da COP 30.
O Brasil integra, junto com Indonésia e República Democrática do Congo, o seleto grupo de países onde o desmatamento ainda responde por mais emissões do que petróleo, carvão ou gás. Com o avanço no controle da derrubada de florestas, o desafio passa a ser conter os impactos da agropecuária e do setor energético.
Energia e transporte sob pressão
Apesar do crescimento das fontes renováveis — especialmente hidrelétricas e parques eólicos —, o setor elétrico brasileiro ainda depende das termelétricas em períodos de seca. Em 2024, a geração de eletricidade emitiu 44 milhões de toneladas de CO₂, um aumento de 17% em relação ao ano anterior. No transporte, a alta produção de cana-de-açúcar reduziu o preço do etanol, ajudando a conter emissões de automóveis, mas o transporte de cargas segue dependente de diesel e gasolina, somando cerca de 120 milhões de toneladas anuais de CO₂.
Pecuária segue como principal vilã
A pecuária continua sendo a maior fonte de gases de efeito estufa no país, tanto pela expansão de pastagens quanto pela emissão de metano — o chamado “arroto do boi”. O rebanho bovino brasileiro libera cerca de 1,1 bilhão de toneladas de CO₂ por ano, superando as emissões totais do Japão.
Para David Tsai, coordenador do SEEG, o cenário exige uma estratégia mais ampla. “Vai ser super desafiador caminhar para cumprir as metas de 2030, de 1,2 bilhão de toneladas. O controle das emissões no Brasil não deve ficar mais só nas costas do desmatamento”, afirma. “Está evidente agora que precisamos aprimorar todos os setores.”


