Por uma Lei Angela Ro Ro de seguridade social para nossos artistas
A morte de Angela Ro Ro expõe a ausência de políticas públicas para trabalhadores da cultura e exige a criação de uma lei de seguridade social específica
A cantora e compositora Angela Ro Ro partiu de forma dolorosa e simbólica. Maltratada pela ausência de políticas públicas consistentes para a cultura, viveu os últimos anos em condições que escancararam não apenas a solidão, mas também a precariedade material de muitos artistas brasileiros. O sofrimento do envelhecimento, agravado pela falta de renda e de proteção social, foi o cenário em que uma das vozes mais geniais da música nacional enfrentou seus dias finais.
No mês passado, seu advogado, Carlos Eduardo Campista de Lyrio, já alertava que a cantora atravessava uma situação crítica: vivia com apenas R$ 800 mensais de direitos autorais, sem aposentadoria, sobrevivendo com a ajuda de vizinhos e amigos. “Angela vivia da voz dela, literalmente. É uma pessoa que recebia pelos shows e, com isso, pagava as contas”, disse ao jornal O Globo.
Enquanto o público consumia sua obra nos streamings, ela era espoliada por uma lógica de mercado neoliberal e cruel que remunera pouco e mal. O que Angela sofreu não foi exceção, mas a regra silenciosa de muitos artistas que, longe do brilho da juventude e sem patrimônio acumulado como grandes nomes da MPB, como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia, enfrentam o declínio de suas carreiras em completo desamparo.
Sua morte deveria significar mais do que notas de pesar e homenagens tardias. Deveria inspirar um debate urgente sobre a criação de uma política pública de seguridade social para artistas — uma “Lei Angela Ro Ro”, que garantisse alguma dignidade aos fazedores de cultura - um tipo de prestação continuada, assim como as leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo foram símbolos de resistência e reconhecimento.
Muitas categorias profissionais no Brasil conquistaram legislações específicas, algumas com privilégios abusivos, como na classes política e no Judiciário. Por que os artistas, que também são trabalhadores e que tanto contribuem para a identidade e a memória cultural do país, seguem relegados à própria sorte?
Faço um apelo ao presidente Lula, à ministra da Cultura Margareth Menezes, ao ministro da Previdência Wolney Queiroz e ao Congresso Nacional: debatamos um plano de seguridade social para nossos artistas. O Brasil, que tanto se orgulha de sua cultura, não pode permitir que seus criadores morram em abandono. É hora de transformar o luto por Angela Ro Ro em ação e garantir dignidade para aqueles que nos deram tanto.
PS: Continuem ouvindo Angela Ro Ro, vendo suas entrevistas, se encantando com sua alegria de viver. Ela viverá assim.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.