Peter Häberle: um gênio à frente de seu tempo
Somos um, mas somos muitos. Somos diferentes, mas iguais. A língua, a cultura e a religiosidade nos unem
Poucas pessoas influenciaram tanto o discurso acadêmico e judicial no Brasil quanto Peter Häberle.
Uma pequena e conceituada editora do Rio Grande do Sul publicou seu livro na década de 1990 — a Sergio Fabris Editora —, causando verdadeira revolução entre os professores da área.
Eu fui afetado diretamente, assim como Lenio Streck, Ingo Sarlet, Andrea Zenker e outros autores.
O conceito de uma grande e democrática comunidade de intérpretes da Constituição, em um país que, como a Alemanha, praticava o sistema de controle concentrado de constitucionalidade, era algo paradoxal.
Em um sistema concentrado ou abstrato de constitucionalidade das leis, somente alguns poucos titulares detêm a prerrogativa de promover o controle de constitucionalidade na Corte Constitucional.
Häberle sugeriu um conceito universal e expansivo, de maneira que a Constituição alemã somente estaria viva se todos a invocassem como um argumento dotado de inquestionável legitimidade.
A democratização desse conceito — algo elementar a alguém que viva nos Estados Unidos — até então era vista com reservas na Europa continental. Havia uma justificada desconfiança contra juízes oriundos do ancien régime.
Uma sociedade aberta de intérpretes da Constituição era um projeto ambicioso e revolucionário. Ela empoderava cada um dos cidadãos para questionar a constitucionalidade de uma lei aprovada pelo elitista Parlamento.
O legado deixado pela obra de Peter Häberle toca diretamente nas deficiências do sistema eleitoral representativo puro no Brasil.
Nosso país comporta muitas raças e sotaques, dada a sua dimensão continental. Nem mesmo a maior rede de comunicação do Brasil conseguiu simplificar e unificar um povo que vive em condições tão distintas.
Ainda assim, somos todos brasileiros e deixaremos um legado de tolerância política e harmonia racial.
O grande experimento americano não se deu nos Estados Unidos, mas sim em nosso Brasil.
Tolerância, redenção e fraternidade são elementos que compõem nossa história e nossa antropologia.
Nenhum governo passageiro de quatro anos irá mudar esta realidade.
Somos um, mas somos muitos. Somos diferentes, mas iguais. A língua, a cultura e a religiosidade nos unem.
Brasil: a utopia realizada de Peter Häberle.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.