ODS além do discurso: a transversalização da Agenda 2030 nas políticas públicas
Como o Brasil está usando os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para enfrentar as desigualdades
Em 2024 o Brasil protagonizou um capítulo inédito no campo do debate racial e do esforço global pelos ODS na ONU: apresentou o ODS 18, iniciativa voluntária de criação de um objetivo dedicado à Igualdade Étnico-Racial, na perspectiva de que o desenvolvimento sustentável só será possível com o enfrentamento do racismo. Antes disso, apenas dois países adotaram um décimo oitavo ODS: em 2020 a Índia propôs um ODS 18 sobre o empoderamento local e o desenvolvimento rural; e a Costa Rica propôs um ODS 18 sobre a felicidade e o bem-estar das pessoas. A inciativa brasileira propôs novas metas que vão desde acabar com a violência contra povos e comunidades indígenas e afrodescendentes, eliminar a discriminação étnico-racial no trabalho até garantir justiça, saúde e educação equitativas. Liderada pelo Ministério da Igualdade Racial com apoio do PNUD, a iniciativa nasceu do reconhecimento de que as mesmas desigualdades históricas que consolidaram o racismo estrutural no âmbito da sociedade brasileira agora impedem o cumprimento da Agenda 2030.
Mas a proposta não é só sobre reparação: é um plano concreto para a transformação social, com indicadores mensuráveis e participação social. O desafio é fazer com que esse ODS brasileiro inspire o mundo a incluir a pauta da promoção da igualdade étnico-racial e do enfrentamento ao racismo no cerne das ações para alcançar o desenvolvimento sustentável. A Agenda 2030 foi estabelecida pela Organização das Nações Unidas em 2015 e pode ser definida como um marco global no compromisso com o desenvolvimento sustentável, integrando as dimensões econômica, social e ambiental. O Brasil, como signatário desse compromisso, assumiu o desafio de implementar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em suas políticas públicas, tarefa coordenada no âmbito do poder executivo federal pela Comissão Nacional para os ODS (CNODS), vinculada à Secretaria-Geral da Presidência da República. Instituída em 2023, a CNODS tem a finalidade de internalizar a Agenda 2030 em todas as esferas de governo, com participação social, transparência e efetividade.
Fato é que o compromisso brasileiro com a Agenda 2030 exige mais do que a mera adaptação de políticas existentes, requer uma transformação na maneira como o Estado formula, executa e avalia suas ações. Tal transformação pode ser definida como a adoção de um novo paradigma metodológico que possibilite a transversalização dos ODS nas políticas públicas. Nesse sentido, o poder judiciário, a partir da experiência do Supremo Tribunal Federal (STF) serve como exemplo relevante, pois ao identificar em suas decisões e programas os ODS diretamente impactados, o STF demonstra como é possível integrar a agenda global ao cotidiano institucional, evidenciando a repercussão dos ODS na atuação do judiciário e permitindo que a população acompanhe de forma didática e efetiva sua contribuição para o desenvolvimento sustentável. Essa prática precisa ser incorporada por todas as esferas do poder público, com a criação de mecanismos que tornem explícita a relação entre orçamentos, programas e legislações e os ODS correspondentes, fortalecendo a associação entre as ações cotidianas de governo e a Agenda 2030.
Nesse contexto, a política de participação social, por meio de seus mecanismos e instâncias, os Conselhos, Conferências e Fóruns, surge como uma alternativa estratégica para a fortalecimento e a popularização dos ODS. Tais instâncias têm o potencial de incorporar os ODS como eixo central de debates, evidenciando a relação entre as demandas da sociedade e a Agenda 2030, o que torna essa pauta acessível à população, além de demonstrar o quanto o poder público tem avançado ou não em cada objetivo e meta, o que fortalece o monitoramento da implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável nas políticas públicas. Os Conselhos Nacionais podem adotar os ODS como referência para a avaliação de políticas públicas, enquanto as Conferências Nacionais podem dedicar-se a temas específicos da Agenda 2030, gerando propostas concretas para sua implementação. Além disso, observatórios e movimentos sociais podem utilizar os ODS como parâmetro para o monitoramento e a demanda por ações governamentais, fortalecendo o controle social, a exemplo do Movimento Nacional ODS, que atua nos estados e munícipios para mobilizar e articular todos os setores da sociedade para promover o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
O Brasil está comprometido com a concretização dos ODS e tem atuado para efetivar políticas públicas alinhas à Agenda 2030. Algumas das medidas desse compromisso são a instituição da Comissão Nacional para os ODS e a criação inovadora do ODS 18 - Igualdade Étnico-Racial. Mas, é preciso democratizar essa agenda, por meio de uma abordagem que combine articulação institucional, participação social e transparência, a fim de que os objetivos sejam verdadeiramente incorporados ao cotidiano da sociedade ao acessar cada política pública e espaço de deliberação democrática. A Agenda 2030 não é apenas uma responsabilidade do Estado, mas um compromisso coletivo que exige o envolvimento de todos os setores da sociedade a fim de assegurar que alcancemos justiça social com desenvolvimento sustentável e verdadeiramente inclusivo.
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