O país não precisa de mais deputados, precisa de mais compromisso
Caso o Congresso insista em derrubar o veto do presidente Lula, caberá à sociedade reagir e cobrar coerência
E a semana fecha com uma notícia que deixou a população brasileira um pouco mais aliviada. Mesmo sob pressão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou integralmente o projeto de lei complementar que aumentaria o número de deputados federais de 513 para 531. O veto, publicado no Diário Oficial da União na quinta-feira (17), não foi apenas uma decisão técnica — foi um gesto político coerente com a responsabilidade fiscal, o equilíbrio federativo e a defesa da Constituição.
O projeto havia sido aprovado pelo Congresso como resposta a uma exigência do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a atualização da representação proporcional na Câmara dos Deputados conforme os dados do Censo 2022. No entanto, ao invés de redistribuir as vagas entre os estados conforme prevê a Constituição, o Parlamento optou por inflar o número de cadeiras, gerando um custo estimado de R$ 65 milhões por ano à União — sem contar o efeito cascata nas Assembleias Legislativas estaduais, com impacto de até R$ 22 milhões por ano aos cofres dos estados.
Lula ouviu os pareceres técnicos dos ministérios da Fazenda, Planejamento, Justiça, da Advocacia-Geral da União e vetou por contrariedade ao interesse público e por inconstitucionalidade. A medida feria claramente a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025 e o artigo 27 da Constituição Federal, ao prever aumento de despesa obrigatória sem estimativa de impacto orçamentário, fonte de custeio ou medida compensatória.
A Câmara, insatisfeita, já se articula para tentar derrubar o veto. Mas a verdade é que o Congresso optou por um caminho cômodo, ao invés de promover uma redistribuição que reduziria cadeiras em estados que perderam população, escolheu simplesmente aumentar o número total, preservando seus próprios interesses regionais. Isso mostra o quanto ainda estamos longe de uma política comprometida com o interesse nacional.
O STF não exigiu aumento de parlamentares, mas sim correção da representação. E esse ajuste pode — e deve — ser feito dentro do limite já estabelecido de 513 cadeiras. A alternativa agora, com o veto mantido, será o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) redistribuir essas vagas até 1º de outubro, conforme prevê a decisão da Corte.
Diante da grave crise fiscal que o país enfrenta, ampliar a máquina pública sem contrapartida é uma irresponsabilidade. Não se pode normalizar que a solução para impasses políticos seja sempre o aumento de gastos. É preciso lembrar que cada novo parlamentar implica em estrutura, equipe, gabinete, assessores, passagens, verbas e emendas — e tudo isso sai do bolso do povo brasileiro.
Lula fez a escolha certa. Vetou com base técnica e responsabilidade. Fez valer o papel do Executivo como guardião do equilíbrio fiscal e da razoabilidade institucional. Em tempos de populismo legislativo, onde tudo parece girar em torno de autobenefícios parlamentares, o gesto do presidente reforça a importância de governar com os pés no chão.
Caso o Congresso insista em derrubar o veto, caberá à sociedade reagir e cobrar coerência. Afinal, representatividade não se constrói com mais cadeiras, mas com mais compromisso público.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.