O Judiciário e as diversas formas de racismo
No Brasil, a Justiça é cega e branca
Em um país onde 56% da população é autodeclarada negra, nós temos um Judiciário que não representa essa parcela da população. Para se ter uma ideia da discrepância entre população negra e representatividade negra no Judiciário, um levantamento do Conselho Nacional de Justiça revela que o Brasil tem apenas 14,25% de juízes que se declaram negros. Esse estudo foi realizado e divulgado este ano. Isso mesmo, em 2024.
E quando se fala em Justiça Estadual, esse número cai mais ainda, chegando a 13,1% dos magistrados. Isso reflete na falta de conhecimento sobre a população negra e periférica, acarreta falta de empatia e sensibilidade, como é a situação que passei. Há algum tempo, sofri alguns atentados e, durante todo o processo, enfatizei que essa situação era muito mais do que simplesmente uma “tentativa de roubo”, como foi lavrado no boletim de ocorrência. É uma violência política, de gênero e de raça.
No último atentado que sofri, a pessoa atirou no carburador do carro. Em qual universo essa pessoa estaria se quisesse roubar um carro e atirasse em um equipamento vital para seu funcionamento? Mas, judicialmente, é mais fácil e prático, não existe defesa contra as acusações feitas a uma pessoa que é minorizada desde o início da escravização no Brasil, sem nenhum tipo de representatividade. Além disso, sabemos o que o racismo provoca na sociedade, como a falsa solução, privando pessoas negras de liberdade como “resolução de um crime” que não querem investigar.
Agora, depois de vários incidentes, uma juíza emitiu uma condução coercitiva para que eu fosse depor sobre o caso e, durante a audiência, me tratou como se eu fosse ré no processo, isso porque a Justiça me intimou por telefone, eu estava fora do Brasil e quando fui explicar o motivo de não ter comparecido ao chamamento, ela me mandou “calar a boca”.
Além disso, depois de algumas discordâncias, pasmem, perguntou se eu achava adequada a prisão do menor que foi detido ou se eu relaxaria a prisão. Ela se acha juíza ou justiceira? Em um país onde a Justiça, em sua maioria, é cega e branca, ela ser justiceira é mais louvável que fazer justiça.
Continuo com minha tese de que esses acontecimentos devem ser classificados como violência política de gênero e raça, por eu ser uma mulher negra, muito bem votada, graças à população do Rio de Janeiro, e por tocar em assuntos historicamente dolorosos para nosso povo de periferia e lutando contra os privilégios de autoridades que ainda insistem em tirar nossa liberdade, usando desses subterfúgios para encarcerar ainda mais pessoas negras.
A quem interessa um possível afastamento meu do meio político? Quem mandou esse menor atirar no meu carro? E pergunto isso sem ter a certeza que foi ele. É preciso que o Judiciário aja com celeridade e eficácia para responder a essas perguntas.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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