Lula precisa vetar integralmente o 'PL da Devastação' para preservar a liderança climática do Brasil

A possível sanção, mesmo que parcial, do Projeto de Lei 2.159/2021, conhecido como PL do Licenciamento Ambiental, significará um gravíssimo retrocesso na política ambiental brasileira. Caberá ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidir entre manter o protagonismo climático que o país reconquistou no cenário internacional ou ceder ao obscurantismo ambiental imposto por um Congresso dominado pela direita ruralista. O projeto, aprovado pela Câmara e pelo Senado, desestrutura décadas de regulamentação e abre caminho para a desregulação em larga escala da proteção ambiental no Brasil.

A tentativa de evitar o confronto direto com o Congresso, conforme sinalizam bastidores publicados na imprensa, não pode ser justificativa para abdicar de princípios fundamentais. É verdade que há resistência dentro da Casa Civil, que defende ajustes nas regras para dar celeridade a obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mas não se pode tratar com leveza um texto que autoriza o autolicenciamento de empreendimentos potencialmente poluidores, permite o desmatamento de áreas da Mata Atlântica sem análise de órgãos competentes, ignora territórios indígenas e quilombolas ainda em processo de regularização, e isenta bancos financiadores de responsabilidades ambientais.

Esse desmonte regulatório chega no pior momento possível: às vésperas da COP30, que será sediada em Belém, capital de um estado amazônico. O Brasil quer, com razão, assumir a liderança global em temas como transição energética, financiamento climático, bioeconomia e preservação de biomas. Mas essa ambição se torna contraditória caso o governo federal aceite o coração do PL da Devastação. Como esperar que outros países levem a sério nossas metas de redução de emissões se não formos capazes de proteger nem mesmo os últimos 12% de florestas maduras da Mata Atlântica?

A expansão do etanol na gasolina, o aumento das misturas de biodiesel, o investimento em mobilidade urbana com 2.500 km de novos corredores de transporte coletivo e os planos ecológicos encampados pelo Consórcio Nordeste são exemplos de avanços importantes no campo da sustentabilidade. No entanto, todos esses esforços serão ofuscados por um único gesto de recuo institucional. Uma sanção parcial do PL 2.159/2021 colocará em xeque a autoridade moral do Brasil para cobrar ações climáticas de outras nações e atrapalhará, inclusive, a atração de recursos do financiamento climático global.

Lula não pode se omitir. Não basta negociar artigos ou vetar trechos simbólicos. O PL 2.159/2021 representa um cavalo de Troia legislativo: sua essência é o desmonte do licenciamento ambiental. A defesa do meio ambiente é cláusula civilizatória, compromisso constitucional e pilar da credibilidade internacional do Brasil. Vetar integralmente esse projeto é uma obrigação moral, política e estratégica. Ao fazê-lo, Lula não enfrentará o Congresso; estará defendendo o futuro do país e o planeta.