IOF: para defender o povo e a Constituição, o governo Lula deve recorrer ao STF
O Congresso não pode usurpar competências que não lhe pertencem e comprometer o funcionamento do Estado brasileiro
A recente decisão do Congresso Nacional de sustar o Decreto nº 12.499/2025, que reajustava alíquotas do IOF sobre operações cambiais, representa um dos episódios mais graves de interferência política indevida no núcleo da política econômica do Executivo desde a Constituição de 1988. Trata-se não apenas de um erro técnico e jurídico, mas de um atentado contra o princípio da separação dos Poderes e contra os interesses do povo brasileiro.
Segundo o art. 153, §1º da Constituição Federal, o Poder Executivo tem competência expressa para alterar alíquotas do IOF por meio de decreto, desde que respeitados os limites legais. Essa prerrogativa é reafirmada por reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconhecem o caráter extrafiscal do IOF — um imposto que serve justamente para o governo regular o mercado financeiro, o fluxo de capitais e o consumo externo, com agilidade e autonomia.
Ao sustar esse decreto via Projeto de Decreto Legislativo (PDL), o Congresso violou o limite constitucional de sua competência, prevista no art. 49, V, da Carta Magna. Esse artigo autoriza o Legislativo a sustar atos do Executivo apenas se houver extrapolação do poder regulamentar, o que não ocorreu no caso em questão. O decreto do presidente Lula estava perfeitamente alinhado à legalidade constitucional e à prática institucional consolidada. O que houve, portanto, não foi um controle jurídico, mas um movimento de retaliação política travestido de legalidade.
A motivação real por trás da ofensiva é clara: trata-se de uma reação à crescente limitação do STF sobre as emendas parlamentares — especialmente as chamadas “emendas de relator”, utilizadas nos últimos anos como instrumento de barganha e concentração de poder orçamentário. Com o controle judicial apertando e a negociação política escassa, setores do centrão e da direita usaram o PDL como moeda de pressão, atingindo o governo onde ele ainda tem margem de manobra: sua prerrogativa constitucional sobre tributos regulatórios.
O resultado prático dessa manobra é devastador para o país. Primeiro, retira-se uma estimativa de R$ 12 bilhões anuais da arrecadação federal, num momento em que o Brasil enfrenta restrições fiscais e precisa de recursos para financiar políticas sociais, infraestrutura e investimentos públicos. Depois, impede-se o uso de um instrumento que poderia coibir a evasão de divisas, o consumo desbalanceado e o desequilíbrio cambial, enfraquecendo a capacidade regulatória do Estado sobre o sistema financeiro.
Mas talvez o mais perverso dessa decisão seja o impacto distributivo: o IOF sobre operações cambiais afeta majoritariamente os mais ricos — quem viaja para o exterior, faz compras internacionais ou movimenta grandes volumes em moeda estrangeira. Ao impedir sua aplicação, o Congresso está protegendo privilégios e aprofundando a desigualdade fiscal em um país onde os pobres pagam, proporcionalmente, muito mais impostos do que os ricos. É mais um passo na consolidação de um sistema tributário regressivo, onde os que menos têm sustentam o peso do Estado.
Do ponto de vista institucional, o precedente é ainda mais perigoso. O Legislativo, ao extrapolar suas funções e invadir competências do Executivo, desorganiza o planejamento econômico do país, sem oferecer nenhuma alternativa de arrecadação, redistribuição ou política pública. E o faz sem diálogo com a sociedade, sem consulta pública, sem responsabilidade com o orçamento ou com os serviços sociais.
O que está em jogo, portanto, não é apenas uma alíquota de imposto — é a própria capacidade do Estado de planejar, regular e financiar o desenvolvimento nacional. É a soberania do Executivo para exercer o papel que lhe cabe na democracia. É o equilíbrio entre os Poderes. É, por fim, a proteção do povo brasileiro contra os interesses de uma elite que quer manter seus privilégios à custa da maioria.
Diante disso, o Governo Lula deve recorrer imediatamente ao Supremo Tribunal Federal para reverter esse abuso. O Brasil não pode aceitar que instrumentos legítimos de gestão econômica sejam sequestrados por chantagens políticas disfarçadas de legalismo parlamentar. O país precisa de responsabilidade social, de redistribuição de renda, de justiça fiscal e de respeito às regras do jogo democrático.
O Congresso tem todo o direito de debater políticas econômicas, de aprovar ou rejeitar projetos de lei. Mas não pode, por vontade circunstancial de sua maioria, usurpar competências que não lhe pertencem e comprometer o funcionamento do Estado brasileiro. Derrubar esse PDL é uma tarefa jurídica, política e histórica. Em defesa da Constituição. Em defesa do povo. Em defesa do Brasil.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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