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      Denise Assis

      Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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      Ecos da caserna em 17 pontos sobre a relação militares e governo

      A presença do lavajatismo e do bolsonarismo ainda são marcantes nos quadros militares

      (Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

      É certo. Há apreensão sobre o rompimento dos vínculos "seculares" entre as forças armadas do Brasil e dos Estados Unidos. Uma eventual ruptura de relações irá paralisar projetos, compras e cursos ministrados aos oficiais brasileiros num intercâmbio entre as nossas Forças e o Comando Sul estadunidense. Uma fonte próxima ao alto comando confirmou que a torcida é para que essa troca não seja interrompida e que as relações sigam o seu curso. Nos escalões superiores, onde as negociações entre os dois países são acompanhadas com tensão e nervosismo, a orientação é a seguinte: “Aconselhamos seriamente a aproximação, permanência e suporte aos quadros legalistas no âmbito das Forças Armadas”. Ou seja, torcem para que tudo acabe bem, mas sabem que há dissenções na tropa e é necessário um trabalho para acomodar os “diferentes” para que continuem, no mínimo, sem fazer marola.

      O golpe de 2016 - com participação explícita do ex-chefe do GSI, Sergio Etchegoyen e do ex-comandante do Exército Eduardo Villas Boas, que conspiraram abertamente com Michel Temer para a derrubada da presidente Dilma -, gerou um forte clima de rejeição ao PT, nos quartéis, ao presidente Lula e ao conjunto da esquerda brasileira, com as consequências por todos conhecidas. A presença do lavajatismo e do bolsonarismo ainda são marcantes nos quadros militares, em especial na média oficialidade e na suboficialidade. 

      No momento, a leitura nas fileiras militares sobre a evolução recente do clima e do entendimento da atual crise interna e externa no Brasil pode ser vista da seguinte forma:

      1. Subtenentes, sargentos e cabos estão fortemente inclinados ao bolsonarismo e a recusa de tudo que seja descrito como "politicamente correto", ou dito "woke", entendido como um "roubo" ao mérito e ao sacrifício pessoal, princípios norteadores das Forças Armadas; 

      2. Capitães, majores e tenente-coronéis estão convencidos de que o atual governo está caminhando para o desastre econômico, com as medidas fiscais e tributárias propostas, com claro feitio "socialista"; 

      3. O alto oficialato nas três forças continua dividido entre constitucionalistas, ditos "melancias", e aqueles fortemente bolsonaristas, aliás a maioria;

      4. Os oficiais superiores que tinham condições de deter a marcha do golpe, em especial entre 12/12/22 e 08/01/23, são uma minoria, porém proativos e em posições centrais de mando (comandantes de regiões militares, ou seja, comandam homens armados);

      5. No atual momento, tais oficiais estão em fase de passar para a reserva, e a promoção de novos comandos altera e desequilibra a atual situação;

      6. Foram ou irão para a reserva até 30/08/25 os seguintes oficiais generais: gal. Strumpf, gal. Novaes, gal. Richard Nunes. Não há perspectiva de troca de comando no Exército. O general Thomás Paiva continua à frente do Comando. A situação na Aeronáutica é ambígua, indefinida e há quem questione o posicionamento do brigadeiro Baptista Junior, em seu depoimento ao STF, se colocando contra o golpe de 8 de janeiro. Na Marinha de Guerra há forte apoio ao almirante Garnier. Vale lembrar, o almirante que se colocou à disposição de Jair Bolsonaro para ceder tropas e se aliar ao golpe.

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      7. Nunca é demais lembrar que, embora tenha sido “ironizado” pelo então comandante do Exército, Marcos Freire Gomes - que disse a Garnier que ele aderia ao golpe, mas quem teria de enviar tropas seria o Exército, pois ele não dispunha de homens suficientes -, que o Corpo de Fuzileiros Navais, com 16 mil homens, incluindo forte presença em Brasília, é uma das poucas forças de condição de desdobramento imediato. 

      8. Mas há um porém. O atual comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, o almirante Carlos Chagas Braga Vianna, é um constitucionalista. Está preocupado é com uma modernização por capacidade da força naval;

      9. Há uma insatisfação nas forças com a atual liderança no campo militar, do ministro José Múcio, que classificam como “notável ausência”. O que não faltam são críticas por sua atuação. Tal papel, acreditam, é exercido (informalmente) pelo general Richard Nunes, (autodeclarado negro), e Chefe do Estado-Maior, que irá para a Reserva em agosto de 2025, criando um vazio perigoso na ala dos que defendem a legalidade;

      10. O senão dessa sua ida para a reserva é que isso cria uma torcida para que o general vá ocupar a Secretária Geral do Ministério da Defesa ou mesmo seja o titular da pasta, o que reorganizaria positivamente a hierarquia e o debate na caserna, acreditam. Mas não é demais lembrar que há um acordo tácito, desde a redemocratização, que esse é um cargo a ser ocupado por um civil, que goze da confiança dos Comandos. 

      11. Na última semana, no mesmo dia do anúncio das medidas cautelares contra o ex-presidente Bolsonaro, publicou artigo advertindo contra a "partidarização" da força militar, explicitando o volume crescente de rumores sobre a necessidade de "mão forte".

      12. O Comando Militar recebeu informações de conversas de lideranças do PL - com apelos diretos à intervenção militar - com altos oficiais e empresários num apartamento em Brasília, pertencente a uma liderança do PL. 

      13. A "Intervenção" do governo Trump, nomeadamente defendendo o ex-presidente, produziu um forte impacto sobre o campo militar.

      14. A campanha publicitária "Eles contra Nós", a reforma tributária e a condenação dos Estados Unidos são apontados nas fileiras como uma repetição do clima de 1961-1964, sob a batida denominação de "tempestade perfeita". Ou seja, mais uma vez os militares se metendo a opinar na política partidária, e de governo, sem ter autoridade para tal.

      15. Embora tenhamos diversificação de fornecimento de equipamento militar - França, Alemanha, Itália e até a Rússia - a formação, doutrina, treinamento e os meios organizacionais, incluindo o núcleo de C4I - Command, Control, Comunications, Camputer and Intelligence - é notavelmente estadunidense, dependente de plataformas, satélites e equipamento norte americano. Essa dependência cria uma enorme dificuldade de fazê-los entender que, se houver da parte dos Estados Unidos uma posição radical, é disso que terão de cuidar: do desmame e da troca de tecnologia. Afinal, é para isso que estão sendo formados, para cada vez mais serem independentes em novas tecnologias. Ou não? 

      16. É notável, no momento, a circulação de hipóteses - consideradas remotas pelo alto oficialato - da possibilidade de punições, ou demonstrações de poder, através de plataformas digitais contra aeroportos, serviços elétricos e financeiros brasileiros, como já ocorreram em Cuba e Venezuela, e hoje paira sobre o México.

      17. Há, ainda, apreensão sobre o rompimento dos vínculos "seculares" entre as forças armadas do Brasil e dos Estados Unidos, paralisando projetos, compras e cursos. 

      Todos esses pontos foram discutidos em reunião dos comandos, no dia 20 de julho.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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