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Washington Araújo

Mestre em Cinema, psicanalista, jornalista e conferencista, é autor de 19 livros publicados em diversos países. Professor de Comunicação, Sociologia, Geopolítica e Ética, tem mais de duas décadas de experiência na Secretaria-Geral da Mesa do Senado Federal. Especialista em IA, redes sociais e cultura global, atua na reflexão crítica sobre políticas públicas e direitos humanos. Produz o Podcast 1844 no Spotify e edita o site palavrafilmada.com.

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Copômia, a República Paralisada por Jurus Obscenus

Copômia Brasilis virou vitrine de estabilidade e museu de ambição. Haddadius constrói pontes, Galyppolus ergue barreiras, e Lulix governa o silêncio

Sede do Banco Central, em Brasília - 17/12/2024 (Foto: REUTERS/Adriano Machado)

Desde os tempos em que Roma ditava o preço do trigo e o destino das legiões, os impérios aprenderam que a guerra mais longa não é travada com espadas, mas com moedas. É nesse campo invisível — onde o ouro substitui o sangue — que se desenrola a história de Copômia Brasilis, uma nação tropical e poderosa que, como Roma em seus dias de glória, alterna entre conquistas e sabotagens internas. Aqui, os generais não marcham sobre cavalos, mas sobre gráficos; e as batalhas não se decidem em colinas, mas nas atas solenes do Conselho de Política Omnipotente Monetária, o temido COPOM.

Nesse cenário, dois generais disputam o coração do Império. Galyppolus, o da retaguarda, protege os rentistius, povo bárbaro insaciável, que devora carne humana e regojiza-se com a miséria alheia.. E Haddadius, o da ofensiva, luta para libertar o povo das correntes invisíveis do crédito. Acima deles, paira o imperador Lulix III, reconduzido ao trono pelo povo copomiano, que nele vê o artífice de uma era de estabilidade e inclusão. Em seu terceiro mandato, Lulix tornou-se o símbolo de uma república em reconstrução — e já desponta como favorito inconteste para um quarto, e inédito, mandato imperial.

Lulix confia plenamente em Haddadius, a quem chama de seu “general do pão e da esperança”. É ele quem executa os planos estratégicos, quem multiplica a infraestrutura e sonha com um império que avance com equilíbrio e justiça. Mas no outro flanco, Galyppolus — de nariz proeminente, curvado como o bico de uma ave de rapina — sobrevoa os campos da economia à caça de qualquer sinal de expansão que possa inflamar os preços. Para ele, o crescimento é uma ameaça a ser abatida antes de alçar voo. Há quem diga que Galyppolus deixou-se encantar pelos cânticos da deusa Farias Limanis.

Em novembro de 2025, Copômia ostenta números que fariam corar até os contadores de Augusto: inflação de 5,1%, desemprego em 5,5%, PIB crescendo 2,2%, renda média próxima de R$ 3.500 e o Índice Bovespius — o Coliseu dos mercadores — superando 153.000 pontos, recorde histórico. As legiões produtivas celebram, mas a euforia é breve: os senhores do Norte impuseram tarifas colossais sobre as exportações de Copômia, reduzindo em 12% o volume exportado. Em resposta, Lulix abriu novas rotas comerciais com os reinos da Ásia e da África, firmando alianças que prometem devolver fôlego e dignidade ao comércio coponiano.

Mesmo assim, o general da retaguarda mantém sua muralha. Galyppolus defende a taxa de juros em 15% ao ano, uma das mais altas do mundo, venerando o medo como se fosse virtude. Sua doutrina — festejada pelos rentistius e pelos senhores do capital — é simples: preservar o lucro, mesmo que ao custo do futuro. O capital aplaude, porque lucra. O povo suporta, porque crê.

Haddadius, porém, entende que nenhuma civilização floresceu de joelhos diante dos deuses do juro. Ele exige que Copômia revise, junto ao Governo Central da República dos Bancos, a meta de inflação que aprisiona a economia. Defende que o verdadeiro equilíbrio está na prosperidade compartilhada, e que juros tão altos sufocam o trabalho, retardam o progresso e condenam a plebe a viver de esperança parcelada.

O imperador Lulix tenta equilibrar o trono entre a prudência do banqueiro e o sonho do construtor. Sabe que Haddadius dá movimento à história, enquanto Galyppolus oferece segurança à memória — e que, entre ambos, o império corre o risco de tornar-se uma pintura imaculada: perfeita, mas imóvel. Lulix não entende porque Haddadius indicou  Galyppolus para essa missão.

No grande anfiteatro da economia copomiana, as legiões produtivas esperam o toque da trombeta que nunca vem. Os engenhos dormem, os portos sonham, e a esperança caminha devagar, em passo de procissão. Lulix assiste, sereno e pensativo, enquanto a retaguarda contabiliza vitórias e a ofensiva se inquieta.

Não se pode dizer que Copômia Brasilis venha vencendo a inflação — talvez apenas a contenha à força, sacrificando no altar dos juros a energia que faria o império prosperar. Suas legiões estão prontas, mas acampadas. Se o império quiser renascer, terá de escolher entre o conforto dos templos bancários e o risco glorioso de voltar a conquistar o mundo. Porque nenhum povo que teme o futuro jamais será digno dele.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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