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Michelle Catarine Machado

Jornalista com experiência em comunicação institucional, política, mídias sociais e produção de conteúdos acessíveis e inclusivos

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Como as democracias resistem

Sem memória e justiça, democracias abrem espaço para que a violência se reescreva como patriotismo

Jamil Chade ao centro, de óculos, barba e camisa clara, segurando um livro. À esquerda, Rafaela Machado, de cabelo castanho longo e roupa preta, sorrindo. À direita, Michelle Machado, também sorridente, com cabelo longo, óculos e camisa bege clara (Foto: Arquivo pessoal)

No dia 3 de setembro, em Brasília, no projeto Sempre Um Papo, Jamil Chade apresentou reflexões de sua nova obra “Tomara que você seja deportado: uma viagem pela distopia americana”, discutindo os riscos do autoritarismo e as formas de resistência.

“Já sabemos como as democracias morrem. O desafio é entender como elas resistem.” A frase do jornalista Jamil Chade, lida no evento do projeto Sempre Um Papo, na CAIXA Cultural Brasília, soou como síntese e alerta. Ao compartilhar o último capítulo de seu livro, descreveu o medo nos olhos de imigrantes, o sofrimento das minorias, a violência de sistemas que excluem, mas também a teimosia da resistência que floresce mesmo sob o peso da opressão. Não era apenas literatura: era um testemunho político do nosso tempo.

A leitura de Jamil Chade nos confronta com uma verdade dolorosa: as democracias morrem quando a violência é perdoada, quando a história é apagada e quando a impunidade se instala. Mas ela também nos mostra um caminho: resistem quando o povo se mobiliza, quando a memória é preservada e quando a justiça se cumpre. No Brasil, não basta punir os responsáveis pelo 8 de janeiro. É preciso impedir que o bolsonarismo se reescreva como vítima, que os crimes se transformem em gestos de patriotismo e que o ódio encontre abrigo na indiferença.

Os Estados Unidos mostraram ao mundo como a história pode ser distorcida quando a impunidade se sobrepõe à justiça. Com a anistia aos golpistas do Capitólio, Donald Trump transformou criminosos em vítimas e rebatizou a violência como “dia do amor”. O gesto não trouxe pacificação: alimentou a revanche e fortaleceu o extremismo. Aqui, no Brasil, ensaia-se o mesmo discurso em relação ao 8 de janeiro de 2023. Mas precisamos ser claros: anistiar golpistas não é reconciliar, é repetir o golpe.

A questão, no entanto, vai além da condenação necessária dos responsáveis. É preciso encarar com honestidade: onde estávamos enquanto bolsonaristas e trumpistas se fortaleciam? Democracias não ruem de um dia para o outro. São corroídas por silêncios cúmplices, por instituições hesitantes, pela normalização do discurso de ódio. Perguntar “onde estávamos?” é reconhecer que o autoritarismo não cresce sozinho: encontra terreno fértil na omissão coletiva.

Nesse cenário, a celebração dos 42 anos da CUT tem significado especial. Desde sua fundação, em plena ditadura, a Central Única dos Trabalhadores mostrou que democracia não é apenas um regime político, mas, sobretudo, um processo de luta coletiva por justiça social. Cada greve, cada ato, cada conquista sindical foi também um ato de resistência à opressão. Sua história nos ensina que a democracia só floresce com mobilização popular, sindicatos fortes e homens e mulheres que não se calam diante da opressão.

O futuro nos julgará pela posição que tomamos hoje. Cabe à nossa geração decidir se será lembrada como cúmplice da omissão ou como protagonista da resistência. Quando nossos netos perguntarem onde estávamos em 2025, que possamos responder sem hesitar: estávamos ao lado da democracia, fazendo-a resistir.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.