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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor do livro "Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil". Editor da newsletter "Noticiário Comentado" (paulohenriquearantes.substack.com)

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Aumenta a concentração de renda no Brasil, mas ninguém dá bola

O processo de "pejotização" também faz com que a renda declarada como lucros (e não salários) aumente a concentração dos ganhos no topo

Negros na extrema-pobreza (Foto: Abr)

Não obteve a repercussão devida o estudo dos economistas Sérgio Gobetti e Priscila Kaiser Monteiro, juntos com o cientista de dados Frederico Nascimento Dutra, divulgado na terça-feira (19). A concentração de renda aumentou no Brasil desde a pandemia, o país está ainda mais desigual. Os ricos estão mais ricos. Os muito ricos estão ainda mais ricos, constituindo aquela nata social que nunca perde, aconteça o que acontecer.

A explicação para o recrudescimento da concentração de renda é, em síntese, o crescimento desproporcional dos rendimentos do capital e a não-taxação de dividendos, coroando um sistema tributário regressivo.

O Governo Federal tenta ao menos amenizar o histórico problema, mas o Congresso não responde com a celeridade que o tema requer, ou simplesmente não responde. Em março de 2025, o Executivo encaminhou ao Congresso o Projeto de Lei 1.087/2025, que prevê retenção na fonte de 10% sobre dividendos mensais que ultrapassarem R$ 50 mil por pessoa (com isenção para quem recebe até esse valor). O PL encontra-se em interminável análise por comissão especial. Arthur Lira pôs a mão na cumbuca para que não machucasse demais o andar de cima.

Ao passo que a elite do atraso e seus lobistas, alguns com mandato, fazem de tudo para que a desigualdade permaneça inalterada, ou aprofunde-se, os números apurados pelos pesquisadores revelam-se estarrecedores. Em tempo: a mídia não se mostrou escandalizada com a cruel realidade socioeconômica, preferindo perder tempo a buscar formas de culpar Lula pelos arroubos colonialistas de Donald Trump.

Um resumo do estudo do trio de pesquisadores nos dá um retrato perfeito do Brasil que alguns não querem que mude.

O trabalho é baseado em dados do Imposto de Renda entre 2007 e 2023 e identificou que 90% do aumento da concentração de renda nos estratos superiores advêm de lucros e dividendos, cujo valor distribuído, não tributado, cresceu de R$ 371 bilhões em 2017 para R$ 830 bilhões em 2022.

Mais grave: 85,7% do crescimento nessa faixa do 1% mais rico veio daqueles que integram o 0,1% mais rico do país, com renda a partir de R$ 1,75 milhão anuais. Essa faixa avançou de 9,1% para 12,5% da renda disponível total do país. E metade do crescimento da faixa de 0,1% foi capturada por uma faixa mais privilegiada ainda, aquela do 0,01% mais rico.

O processo de "pejotização" também faz com que a renda declarada como lucros (e não salários) aumente a concentração dos ganhos no topo. Houve uma redução no peso da renda salarial e um salto expressivo nos rendimentos de lucros dentro da elite.

“Quanto mais se sobe na pirâmide, maior o crescimento”, disse Gobetti à imprensa. “O crescimento de renda dos mais ricos no Brasil é até superior ao crescimento do PIB chinês”, observou. Mas ninguém pareceu se indignar.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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