Agora o crime é realmente organizado
O crime organizado deixou as drogas e assumiu negócios que vão da economia formal à política, consolidando um poder paralelo no país
Já faz tempo que os traficantes ficavam apenas vendendo todo tipo de drogas. Isso já não gera mais o rendimento de antes. Foi necessário se reinventar. Foi preciso expandir a atuação, primeiro pela economia, lavagem de dinheiro e depois no setor público. Por tempos se discutiu e se tentaram estratégias para barrar o avanço das drogas, em uma indústria que movimenta milhões e nunca consegue resolver nem a fonte, nem a distribuição. Desde a criação do Comando Vermelho como uma organização criminosa no Instituto Penal Cândido Mendes, conhecido como presídio da Ilha Grande, em Angra dos Reis, no regime militar, onde presos comuns receberam lições dos presos políticos sobre organização, hierarquia e ações de enfrentamento.
O foco sempre foi a venda de drogas e apropriação de territórios. Com a chegada das milícias, acabou o cuidado dos bandidos com a comunidade que os protegia por causa disso e chegou a brutalidade aos residentes. Áreas conflagradas tinham que consumir parte da economia dominada pelos bandidos: internet, gás, posto de gasolina, transporte público, além de taxas variadas. Isso começou a dar certo. O que era um objetivo do Comando Vermelho de assaltar bancos e vender drogas, instalando uma célula da organização na Rua Altinópolis, nº 313, Ilha do Governador, virou um governo paralelo da Zona Oeste.
A expansão cada vez maior do crime organizado leva a problemas sociais de toda ordem. Em São Paulo, como se não bastasse o cigarro falsificado ganhar as ruas do Estado e do país, agora entraram no ramo das bebidas falsificadas. Por causa disso, a PF entrou na investigação das mortes devido a bebida contaminada por metanol, o que gerou atrito entre o governador de São Paulo e o Governo Federal. Apesar das mortes estarem concentradas basicamente no Estado de São Paulo, a prática se ramifica pelo país. Nesse caso, o PCC como organização criminosa. O diretor da PF, Andrei Rodrigues, afirma essa possibilidade, porque o PCC importou grande quantidade de metanol no porto de Paranaguá.
Quando era apenas a adulteração de postos de gasolina pelo Brasil, o prejuízo ficava no motor. Porém, em uma operação gigante contra esse crime, que cortou na raiz essa prática, o PCC passou a reutilizar a sobra de metanol vendendo para fabricantes de bebidas, o que agora resultou em cinco mortes de jovens. Como a falsificação é considerada crime menor, uma contravenção, os braços dos bandidos só aumentam. A indústria prolifera em cigarros, bebidas, roupas, brinquedos, eletrônicos, remédios etc.
O incômodo de Tarcísio de Freitas com a entrada da PF no caso, que prometeu investigação rápida, deveria realmente se dedicar a uma situação que pode ser nacional, mas viajou para Brasília para visitar o ex-presidente Bolsonaro. Isso levanta dúvidas sobre o porquê de centralizar em São Paulo. Devemos lembrar que, em 2024, o ex-chefe de segurança de Tarcísio e um policial civil foram presos por integrarem esquema de fintechs com o PCC. E o risco corrido pelo delegado Umberto Alberto Gomes, morto pelo PCC? E o esquema financeiro do PCC na Faria Lima?
O uso de metanol na bebida não é novidade no mundo. Em 2024, 53 pessoas morreram na Índia no mesmo modus operandi. O metanol em pequena quantidade é usado no processo de fermentação dos açúcares e pectinas, mas como são adulteradas por leigos, essas quantidades não são fiscalizadas. Apesar dos bares identificados que venderam as bebidas falsas afirmarem não saber da origem adulterada, qualquer bartender sabe olhando para a garrafa. Logo, na prática, é pagar pouco e ganhar mais, não importando o consumidor. A lógica do capitalismo sendo aplicada também no crime, que precisou se organizar de verdade para sobreviver no mercado. É a chamada diversificação de portfólio, uma arma estratégica para ampliar fontes de renda e que faz parte do business development.
O caso em São Paulo deve ter um desfecho rápido por preocupação eleitoral de Tarcísio e não deve se estender por muito tempo. O assustador – paradoxalmente, para todos – é que tenha chegado onde está.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.