Relação entre Brasil e China no mercado de soja é marcada por dependência mútua, afirma representante da indústria brasileira
Presidente da Abiove destaca confiabilidade brasileira como fornecedora e aponta oportunidades de cooperação em tecnologia e agregação de valor
247 – Em meio à intensificação das disputas comerciais iniciadas pelos Estados Unidos com diversos países, a China tem ampliado significativamente suas compras de soja de nações sul-americanas como o Brasil e a Argentina. Essa movimentação tem reposicionado o Brasil como protagonista nesse mercado, tema explorado em uma entrevista exclusiva com André Nassar, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), publicada pelo portal chinês Global Times (link original).
Segundo Nassar, a relação entre Brasil e China no mercado de soja é de “dependência mútua”. A China necessita da soja brasileira para manter sua poderosa indústria de processamento, enquanto o Brasil vê no país asiático o principal destino de seus grãos. “Essa dinâmica é fortalecida pela presença de investimentos chineses no Brasil”, observou o presidente da Abiove.
Confiança e estabilidade fortalecem parceria
A consolidação do Brasil como principal fornecedor de soja para a China ocorreu a partir de 2018, quando se intensificaram os atritos comerciais entre Pequim e Washington. Desde então, as exportações brasileiras cresceram e hoje são mais de três vezes superiores às dos Estados Unidos para o mercado chinês. “O grande diferencial que nos permite ampliar nossa participação no mercado chinês é a relação de confiança, estabilidade e regularidade que construímos ao longo do tempo”, ressaltou Nassar.
Durante a pandemia, essa confiabilidade foi testada e reafirmada. Para o executivo, o futuro da parceria deve incluir investimentos chineses na cadeia logística da soja no Brasil e, do lado brasileiro, um esforço para exportar produtos com maior valor agregado, como carnes e farelo de soja.
Capacidade de resposta e infraestrutura
O aumento da demanda chinesa já é perceptível nos dados: apenas em abril, o volume de soja brasileira movimentado no Porto de Ningbo Zhoushan saltou 30% em relação ao ano anterior. Nassar afirma que o Brasil está pronto para responder: “Estimamos que entre 35% e 40% da safra atual ainda não foi comercializada, e é provável que essa parcela seja direcionada à China”.
Sobre a infraestrutura, ele garante que “a logística brasileira tem capacidade para absorver e transportar esses volumes adicionais”. Contudo, ele alerta que os sinais da demanda precisarão ser analisados pelos produtores para decidir sobre uma possível ampliação da área plantada.
Impactos da guerra comercial e competição com os EUA
A guerra comercial iniciada pelos Estados Unidos provocou uma reconfiguração do mercado: mais soja brasileira para a China, menos para outros destinos. Nassar destaca que essa mudança trouxe consequências como o aumento de custos internos e a redução da disponibilidade de matéria-prima para a industrialização local.
Quanto à concorrência com os EUA, ele aponta possíveis distorções: “Caso os Estados Unidos acumulem excedentes, podem buscar novos mercados ou estimular a industrialização interna da soja”. Isso poderia pressionar os preços do farelo no mercado internacional, afetando diretamente a rentabilidade da indústria brasileira, que exporta mais da metade de sua produção.
Sustentabilidade e moratória da soja
Sobre críticas ao impacto ambiental da soja na Amazônia, Nassar foi enfático: “Desde 2006, o setor implementou a Moratória da Soja, acordo que assegura que a expansão do cultivo na região ocorra apenas em áreas desmatadas anteriormente”. Ele afirma que o setor possui um sistema robusto de monitoramento e incentiva a produção apenas em áreas convertidas no passado.
Futuro da parceria e agricultura inteligente
Para os próximos cinco a dez anos, Nassar projeta que a China buscará maior autossuficiência na produção de soja, mas acredita que a demanda global continuará em crescimento. Nesse contexto, propõe que o país asiático passe a importar também farelo de soja brasileiro, agregando valor à cadeia produtiva nacional.
No campo da agricultura inteligente, ele vê oportunidades estratégicas: “A indústria de insumos chinesa tem potencial para desenvolver novas variedades de soja com maior teor de proteína ou óleo”. Essa diversificação, segundo ele, seria benéfica para atender diferentes demandas do mercado global. A cooperação em logística e inovação no transporte e armazenamento também é apontada como prioritária.
A entrevista com André Nassar revela não apenas o peso do Brasil no abastecimento de soja para a China, mas também a complexidade e o potencial de crescimento da parceria. Em um cenário de incertezas geopolíticas, a construção de relações comerciais estáveis, sustentáveis e com maior valor agregado parece ser o caminho mais promissor para os dois países.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: