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João Lister

Advogado, graduado pelo UNIUBE – Universidade de Uberaba, Pós Graduado MBA, em Direito Empresarial pela FGV

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Os negacionistas do dólar: mercado especula e tenta disfarçar o jogo político

'O governo deve enfrentar os agentes financeiros por meio da comunicação eficaz à sociedade e da exposição dos interessados no caos cambial', afirma João Lister

Lula e o dólar (Foto: Reuters)

Nos últimos meses, o Brasil vem sendo palco de um enredo conhecido e recorrente: o aumento do dólar é seguido por uma corrida de atores do Mercado à mídia para negar, com veemência, qualquer traço de especulação. A narrativa é a mesma: preocupação com o aumento dos gastos públicos do governo, especialmente após o anúncio da isenção do Imposto de Renda para rendas de até R$ 5.000, 00. No entanto, a análise minuciosa dos fatos e dos dados desvela uma outra realidade: o dólar sobe no Brasil em desacordo com o comportamento global e sem fundamentos objetivos, escancarando a mão invisível da especulação doméstica.

A dança do dólar: números que falam por si

Dados do Banco Central revelam que o dólar comercial saltou de R$ 4, 75 no início de setembro para R$ 6,30 em 19 de dezembro de 2024, um aumento expressivo que revela a gravidade do movimento especulativo. No mesmo período, a moeda americana apresentou desvalorização ou estabilidade frente a outras moedas emergentes, como o peso chileno e o peso mexicano, que, em contraste, se fortaleceram diante do dólar. Esse movimento anômalo no Brasil é sintomático de uma interferência especulativa. As "explicações técnicas" apresentadas pelos agentes do Mercado e seus porta-vozes na mídia não resistem ao crivo dos dados internacionais.

Economia real em alta, mas o dólar também

O que torna a narrativa do Mercado ainda mais suspeita é a contradição com os fundamentos da economia brasileira. Sob a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os índices de emprego, renda, atividade comercial e produção industrial têm apresentado uma performance robusta. De acordo com o IBGE, o desemprego caiu para 7,8%, o menor índice dos últimos oito anos, enquanto a produção industrial acumulou alta de 2,6% no ano. As vendas do comércio varejista também apresentaram crescimento de 3,2%, com destaque para os segmentos de vestuário e alimentos.

No campo fiscal, o governo Lula empreendeu medidas de controle das contas públicas, incluindo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Reforma Tributária, que visa corrigir as distorções do sistema, com maior progressividade tributária. Além disso, o Ministério da Fazenda, sob a liderança de Fernando Haddad, anunciou um superávit fiscal inédito após anos de déficits sucessivos. Dados mostram que o Brasil possui, no contexto do G20, um dos menores percentuais de endividamento público em relação à receita, o que desmente a tese de descontrole fiscal. Se os dados da economia real são tão positivos, por que então o dólar sobe?

Especulação e pressão política

O comportamento especulativo do Mercado, em muitos casos, é uma forma de pressão política. Desde o início do mandato de Lula, parte dos atores financeiros têm tentado condicionar a agenda econômica do governo, em especial sobre temas como juros e tributação sobre dividendos. A tese é clara: quanto maior a instabilidade financeira, maior a capacidade de pressão sobre o governo, que se vê compelido a ceder aos interesses dos grandes investidores.

A dinâmica não é nova. Episódios semelhantes foram observados em 2002, durante a primeira eleição de Lula, quando o "risco Lula" foi amplamente explorado pelo Mercado para gerar fuga de capitais. Agora, o método é mais sutil, mas o objetivo é o mesmo: forçar a renúncia a políticas distributivas e reformas tributárias que ampliem a progressividade dos impostos.

Quem ganha com a alta do dólar?

Não é difícil entender quem são os beneficiários desse cenário. Bancos, fundos de investimentos e grandes exportadores de commodities obtêm ganhos vultosos com a valorização da moeda americana. Essas instituições controlam grandes volumes de contratos de derivativos cambiais, que rendem lucros significativos à medida que o dólar sobe. Em contrapartida, a população em geral sofre as consequências na forma de inflação, com aumento de preços de alimentos, combustíveis e insumos importados.

A corrida à mídia e a retórica negacionista

No momento em que os números passam a ser incontestáveis, entra em cena a retórica do "não é bem assim". Economistas vinculados a bancos e corretoras ocupam espaços privilegiados na mídia, apresentando "análises" que justificam a alta do dólar sob argumentos técnicos que são rapidamente replicados por jornalistas financeiros. O discurso é o de que a alta do dólar é "natural" diante de fatores externos incontroláveis.

Conclusão: uma alta que fala por si

A velha máxima é aplicável: "Todo culpado nega sua culpa". Os principais atores do Mercado, ao negarem a especulação, apenas confirmam sua existência. Dados objetivos demonstram que a alta do dólar no Brasil é resultado de um movimento especulativo, e não de fundamentos reais. Enquanto a economia apresenta indicadores positivos de emprego, renda e produção, o dólar sobe, descolado do contexto internacional.

Resta ao governo Lula, portanto, não apenas manter as medidas de controle fiscal e reforma tributária, mas também enfrentar, com assertividade, o poder dos agentes financeiros. Isso passa por uma comunicação eficaz à sociedade e a exposição de quem são os reais interessados no caos cambial. Se o Mercado nega a especulação, é lícito desconfiar. Afinal, como bem disse o filósofo Søren Kierkegaard, "a negação é o primeiro passo para a verdade".

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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