Washington Araújo avatar

Washington Araújo

Jornalista, escritor e professor. Mestre em Cinema e psicanalista. Pesquisador de IA e redes sociais. Apresenta o podcast 1844, Spotify.

109 artigos

HOME > blog

O céu que não protege — o drama das crianças em zonas de guerra

Segundo a UNICEF, entre 2000 e 2025, conflitos armados mataram dezenas de milhares de crianças

(Foto: Dawoud Abo Alkas/Anadolu via Getty Images)

Nas últimas décadas, as guerras têm roubado a infância de milhões de crianças em Israel, Irã, Palestina, Ucrânia, Rússia e outras regiões devastadas por conflitos. O céu, outrora símbolo de sonhos, tornou-se uma ameaça, de onde caem bombas, mísseis e drones. 

Crianças israelenses vivem sob sirenes que anunciam ataques do Hamas, Hezbollah ou Irã; palestinas enfrentam a destruição de suas casas em Gaza; iranianas, em Teerã e Isfahan, tremem com explosões; ucranianas fogem da violência russa; russas sofrem as consequências de uma guerra que consome seus jovens. Este artigo é um libelo em que denuncio como a guerra rouba a infância de milhares de crianças mundo afora. E ninguém, ninguém, pode dizer sem se envergonhar que essas jovens vidas não poderiam ser salvas.

Um custo incalculável: as crianças mortas

Segundo a UNICEF, entre 2000 e 2025, conflitos armados mataram dezenas de milhares de crianças. Em Gaza, desde outubro de 2023 até junho de 2025, mais de 14.000 crianças palestinas morreram, conforme o Ministério da Saúde de Gaza e a ONU. 

Um estudo da The Lancet (2024) estima que o número real pode chegar a 64.260 mortes por lesões traumáticas até meados de 2024. Na Ucrânia, desde a invasão russa em fevereiro de 2022 até janeiro de 2025, pelo menos 650 crianças foram mortas e 1.300 feridas, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Em Israel, desde 2000, mais de 30 crianças morreram em ataques do Hamas, com dezenas mantidas reféns em Gaza.

A guerra entre Israel e Irã, iniciada em 12 de junho de 2025, trouxe novos números alarmantes. 

Postagens no X atribuídas ao Ministério das Relações Exteriores do Irã relatam que, em ataques israelenses em Teerã, 73 mulheres e crianças morreram, incluindo 20 crianças no complexo residencial Chamran. 

Embora não verificados independentemente, a mídia iraniana confirmou explosões em Teerã, Isfahan e Fordow. Em Israel, ataques iranianos em 13 e 14 de junho atingiram Tel Aviv, Haifa e Jerusalém, ferindo 34 pessoas, incluindo crianças, segundo serviços de emergência. Um bebê de seis dias foi resgatado em Tel Aviv, conforme o Metrópoles.

A Anistia Internacional denuncia a “devastação desproporcional” sofrida por crianças. Em 2024, a organização destacou que ataques a escolas e hospitais em Gaza e Ucrânia violam o Direito Internacional Humanitário. 

A ONU verificou 32.990 violações graves contra crianças em 2023, com Gaza e Ucrânia liderando.

O drama humano: histórias de crianças em meio ao caos

Em Teerã, Afsaneh, de 8 anos, acordou com explosões no bairro Chamran em 13 de junho de 2025. “Pensei que era trovão, mas minha mãe gritou para corrermos ao porão”, relatou à Fars News. 

O ataque israelense, visando instalações militares, atingiu residências, deixando brinquedos ensanguentados entre escombros. Afsaneh, que sonha ser médica, agora teme sair de casa. 

Em Isfahan, Reza, de 10 anos, viu sua escola fechar após bombardeios que destruíram subestações elétricas. “Quero jogar futebol, mas o céu está sempre escuro”, disse à mídia estatal iraniana. Sua irmã mais nova, Leila, de 5 anos, parou de falar após ver um vizinho morto nos escombros, conforme relatou a família à IRNA.

Em Jerusalém, Noa, de 12 anos, descreveu à BBC o terror de correr para abrigos: “A sirene toca, e só penso se verei minha mãe.” Em Tel Aviv, um bebê de seis dias, resgatado dos escombros, tornou-se símbolo de esperança, mas também de tragédia. 

Em Haifa, David, de 9 anos, segundo o Jerusalem Post, recusa-se a dormir sozinho após mísseis iranianos atingirem sua vizinhança. “O barulho não sai da minha cabeça”, confessou. Sua amiga Sarah, de 10 anos, perdeu o pai em um ataque e agora desenha apenas cinzas e fumaça, conforme relatado pela Haaretz.

Em Gaza, Mays, de 13 anos, perdeu a mobilidade em um bombardeio. “Sonhava em jogar futebol, mas agora só vejo cinzas”, disse à UNICEF. 

Em Khan Younis, Omar, de 7 anos, sobreviveu a um ataque que matou sua família. “Eles estão no céu, mas o céu me assusta”, relatou à Al Jazeera. Sua prima Amina, de 9 anos, viu sua escola destruída e carrega cacos de vidro como “lembrança do que perdemos”, segundo a Middle East Eye. 

Na Ucrânia, Olena, de 11 anos, esconde-se em porões em Kiev. “Quero voltar à escola, mas os mísseis não param”, contou à UNICEF. 

Em Kharkiv, Ivan, de 8 anos, perdeu a mãe em um bombardeio e agora vive com a avó em um abrigo, onde, segundo a Reuters, ele chora todas as noites chamando por ela.

Essas crianças — Afsaneh, Reza, Leila, Noa, David, Sarah, Mays, Omar, Amina, Olena, Ivan — compartilham o mesmo pesadelo: explosões, perda de entes queridos, destruição de lares. 

Seus sonhos de ser médicos, artistas ou atletas são sufocados pelo medo. Sua resiliência é um testemunho da força humana, mas também um lembrete da dor de uma infância roubada.

Traumas que ecoam por gerações

O impacto psicológico é devastador. Hannah Arendt alertava que destruir a infância é destruir o futuro. Em Gaza, a War Child Alliance revelou em 2023 que 49% das crianças expressaram desejo de morrer. Na Ucrânia, a UNICEF estima que 7,8 milhões de crianças carregam “cicatrizes invisíveis”. Em Israel, o medo de ataques leva a ansiedade crônica. No Irã, sanções e tensões afetam a saúde mental. Crianças russas, órfãs de soldados, enfrentam estigma.

Robert Fisk descrevia crianças como “vítimas silenciosas, cujos gritos não ecoam na diplomacia”. 

Segundo a OMS, esses traumas causam TEPT, depressão e dificuldades de socialização, perpetuando ciclos de violência. Afsaneh tem pesadelos com explosões; Noa desenvolveu mutismo seletivo; Omar chora pela família perdida; Ivan murmura o nome da mãe enquanto dorme.

A tragédia de Kim Phuc: o grito do Vietnã

Em 8 de junho de 1972, Phan Thi Kim Phuc, de 9 anos, tornou-se um símbolo do horror da Guerra do Vietnã. Uma bomba de napalm, lançada por engano por aviões sul-vietnamitas apoiados pelos EUA, incendiou a vila de Trang Bang. Kim, com a pele queimando, correu nua pela estrada, gritando de dor, enquanto o fogo consumia suas roupas e seu corpo. 

A fotografia de Nick Ut, publicada pela Associated Press, chocou o mundo, mostrando a agonia de uma criança vítima da brutalidade da guerra. Exposta ao agente laranja, uma arma química que causou câncer, malformações e doenças em milhares, Kim enfrentou anos de cirurgias e sofrimento. 

“Eu queria morrer, mas sobrevivi para contar essa história”, declarou em entrevista à NPR em 2017. Sua pele, marcada por cicatrizes, e sua alma, ferida pelo trauma, são testemunhos do custo humano da guerra. 

Hoje ativista pela paz, Kim fundou a Kim Phuc Foundation para ajudar crianças em zonas de conflito, mas sua mensagem é clara: “A guerra é o maior crime contra a humanidade.” Sua história, narrada em The Girl in the Picture, de Denise Chong, permanece um alerta contra a indiferença.

Idosos e enfermos: as outras vítimas

Em Gaza, 59% das vítimas são mulheres, crianças e idosos, segundo o Ministério da Saúde local. A ONU relata que 50% dos hospitais de Gaza estão fechados. Na Ucrânia, a OMS registrou 64 ataques a instalações de saúde até 2022. 

No Irã, sanções limitam medicamentos. Em Israel, a destruição em Tel Aviv e Haifa sobrecarrega hospitais. A desativação do hospital Kamal Adwan em Gaza, em dezembro de 2024, agrava a crise.

As guerras em Israel, Palestina, Ucrânia, Rússia e Irã são tragédias humanas que roubam a infância, a dignidade e a esperança. A UNICEF clama por cessar-fogo, e a Anistia Internacional exige responsabilidade por crimes de guerra. 

Zygmunt Bauman dizia: “A indiferença é o maior aliado da violência.” Que o céu volte a ser um lugar de sonhos, não de bombas. 

Que a humanidade escolha a paz, por Afsaneh, Reza, Leila, Noa, David, Sarah, Mays, Omar, Amina, Olena, Ivan, Kim e todas as crianças. assim como toda criança é matéria-prima da paz, toda mãe é educadora de futuras gerações, mas quando mãe e filho sucumbem aos horrores inimagináveis de uma guerra que eles não pediram nem causaram e que figuram apenas como estatísticas sombrias do quanto perdemos de humanidade, faz-se necessário cessar fogo em todas essas regiões e medidas efetivas e sinceras para restabelecer a paz no mundo o quanto antes.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.

Rumo ao tri: Brasil 247 concorre ao Prêmio iBest 2025 e jornalistas da equipe também disputam categorias

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Cortes 247

Relacionados

Carregando anúncios...
Carregando anúncios...