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Fernando Horta

Fernando Horta é historiador

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Fechem o Estreito de Ormuz, para evitar uma guerra

Aumento da inflação nos países ocidentais fará com que os governos voltem à realidade, escreve Fernando Horta

Estreito de Ormuz (Foto: Reuters)

Há três grandes complicadores no conflito do Oriente Médio neste momento. Se já não bastassem todas as variáveis existentes neste conflito (questões religiosas, interesse estratégico no Petróleo, histórico de rivalidades, genocídios e etc.) nessa nova fase do conflito há três grandes complicadores que, de certa maneira, são novidades conjunturais se pensarmos no desenvolvimento do conflito ao longo do século XX.

Em primeiro lugar, há a fraqueza interna do governo de Netanyahu. Constantemente atacando as instituições e a (pouca) democracia existente em Israel, Netanyahu só aparentemente tem apoio. Seu governo depende da fascistização de Israel, da evocação do inimigo comum e de um estado permanente de guerra. Não é mais suficiente o estado permanente de ameaça – com o qual Netanyahu sempre governou – agora é necessária a guerra. Isso, longe de demonstrar forca, mostra a fraqueza de Netanyahu que depende colocar Israel sempre em posição de ser dizimado para se manter no poder.

Por outro lado, há a fraqueza interna dos governos muçulmanos que, nos últimos anos, viram o descontentamento crescer exatamente por conta dos ataques de Israel e das políticas de apaziguamento. As sociedades muçulmanas, que nunca conheceram uma nesga da ideia de representatividade como o Ocidente desenvolveu, sempre trocaram – em maior ou menor grau – a ideia de participação pela aderência política aos códigos religiosos que também determinavam condutas sociais. Ocorre que, nos últimos anos, este gap de representatividade tem sido testado por uma política ocidentalista com relação ao capital (como ocorre na Arábia Saudita) ou pela política de apaziguamento do Irã que desde o assassinato de Suleimani (em janeiro de 2020) vem assistindo a uma série programada de ataques israelense que minaram a defesa efetiva do território iraniano.

Por último, o mundo hoje vive uma infantilização decisória que tem em Donald Trump sua mais disruptiva figura. Acreditando-se invencíveis, vários governos do mundo (desde a Inglaterra de Boris Johnson, até a França de Macron) trocam ações política efetivas em relação à paz (com o exercício de um certo controle sobre suas falas) por uma “tiktokização” da política internacional onde cada líder diz o que seus apoiadores querem ouvir, como se a arena internacional fosse palco para a gravação de diversos “vídeos” de comunicação que, no fundo, são peças de autopromoção apenas. Trump destrói todas as instituições internacionais que, já com o funcionamento pleno do século XX, tinha dificuldades de lidar com o conflito do Oriente Médio. O que vemos é um persistente genocídio palestino, assistido com indiferença global e agora uma completa incapacidade de conter o projeto alucinado e expansionista de Netanyahu que envolve a reconstrução da “Israel mítica”.

Lideranças sóbrias do mundo estão amarrados em seus conflitos internos e colocados quase em posição de inação. A Rússia de Putin tem uma guerra sem fim com a Ucrânia que assiste a ataques surpresa de drones ucranianos minando a segurança russa como um todo. A China de Xi Jinping já tem a enorme tarefa de manter a economia chinesa funcionando em meio a uma guerra tarifária e também a preparação para um conflito mundial que ela sabe ser quase inevitável. O presidente Lula vive num carrossel de altos e baixos com o parlamento e enfrenta problemas em sua aprovação interna.

Sobra um cenário em que loucos e maníacos passam a tomar decisões internacionais nucleares.

Neste sentido, o conflito Israel-Irã entra perigosamente numa fase em que os tomadores de decisão não podem desafogar o conflito. Nem o Irã pode, a partir desse momento, voltar a política do apaziguamento que, de fato, lhe custou a segurança e a falta de apoio interno, nem Netanyahu pode (mesmo que quisesse) evitar a guerra. Isso significa que se não houver a mediação de atores internacionais de médio peso, o conflito vai carregar o mundo a uma guerra.

Assim, para conter o deslocamento das comunicações políticas sobre um mundo imaginado por cada um dos atores (com Israel se achando invencível, Trump pensando que detém o poder dos EUA nos anos 70 e o Irã se vendo como o guerreiro muçulmano vingador) é preciso criar uma pressão material real para quebrar esse “transe” comunicativo que vivemos, característica da comunicação digital do século XXI e dessa guinada ao fascismo.

É preciso fechar o estreito de Ormuz e bloquear 50% da circulação de petróleo no mundo fazendo o preço do barril disparar e provocando nos países ocidentais uma pressão inflacionária brutal que fará com que os governos voltem à realidade. Isso precisa ser feito em conjunto com todos os países árabes e não de forma unilateral. Os efeitos correlatos disso devem ser suficientes para reequilibrar a balança de poder no mundo, trazendo ganhos para Venezuela, Rússia, Arabia Saudita e para o próprio Irã, enquanto impõem pesadas perdas aos EUA e Europa.

O Brasil, nesse caso, teria uma rara oportunidade de descolar o preço interno da gasolina do preço internacional, e, respaldado por decisões judiciais que certamente serão necessárias, reconhecer a necessidade emergencial da medida estancando a sangria de dinheiro que virou a Petrobrás depois da gestão Bolsonaro. Se não fizer isso, o ministro Haddad não suportaria a pressão e seus planos de austeridade poderiam levar à perda da eleição de 2026 ou até algo pior.

É possível argumentar-se que essa decisão – de fechar o Estreito – vai provocar consequências graves e até mesmo não antecipadas. E isto é verdade. Porém a alternativa é uma guerra regional sem previsão de encerramento na região e a possível escalada para um conflito internacional. Fechar o Estreito de Ormuz é trazer a comunidade internacional à razão da materialidade econômica imediata e provocar um choque de realidade que tem chance de recolocar o mundo na esteira das decisões racionais. Se isso for alcançado com um sólido consenso por parte dos países árabes isso resultaria numa aliança que poderia conter a guerra.

Estamos jogando contra o tempo. A inação, aqui, leva o mundo direto a um conflito que, como foi predito popularmente por Einstein, vai destruir a existência humana como conhecemos.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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