Francisco, a justiça e o combate ao lawfare: uma defesa das democracias
Uma reflexão sobre o legado do Papa Francisco contra o lawfare e a defesa do devido processo como fundamento das democracias
As palavras de Francisco sempre chegaram com clareza e força. O pontífice argentino, acostumado às batalhas cotidianas pela dignidade humana, deixou também um legado vigoroso contra uma das maiores ameaças modernas às democracias: o lawfare, essa prática predatória que usa a lei como arma contra adversários políticos.
O lawfare é a manipulação do direito para prejudicar, perseguir e destruir reputações, carreiras e vidas. É a Justiça transformada em lança, lançada com precisão calculada contra aqueles que ousam questionar estruturas consolidadas de poder.
Foi em junho de 2019, perante magistrados da América Latina reunidos no Vaticano, que Francisco deu o primeiro alerta explícito. O Papa pediu aos juízes que se mantivessem atentos ao uso indevido de processos judiciais que fragilizam instituições e corroem direitos sociais. Denunciou claramente que quando o direito é torcido para objetivos políticos, a democracia e o povo é quem sofre primeiro.
Meses depois, diante da Associação Internacional de Direito Penal, Francisco foi ainda mais incisivo. Disse que, sob o pretexto de combater a corrupção, o lawfare esmaga direitos, alimenta o autoritarismo e fragiliza a confiança popular na justiça. Não foi apenas uma denúncia, esse importante alente, nos convida à reflexão profunda sobre o papel do Judiciário na preservação da democracia e dos direitos sociais.
Para o Papa, o lawfare é mais perigoso por começar sutilmente. Primeiro, surgem rumores nos jornais; em seguida, processos volumosos, com centenas de páginas, mas vazios de provas concretas. E finalmente chegam as sentenças, mais alinhadas à opinião pública que ao rigor técnico da lei. O próprio Francisco mencionou explicitamente a situação vivida por Lula no Brasil, ao indicar a facilidade com que se constrói culpados quando a mídia e o judiciário atuam como cúmplices, e não como vigilantes independentes.
A consequência mais trágica do lawfare é seu impacto sobre os direitos sociais. Políticos perseguidos por meio desse artifício veem seus projetos sociais interrompidos, seus aliados intimidados e os cidadãos mais vulneráveis expostos novamente à exclusão. A lógica do medo se instala: quem ousará defender reformas populares se qualquer iniciativa pode resultar em perseguição judicial?
Francisco sempre insistiu que não há justiça sem respeito ao devido processo legal, sem provas verdadeiras e sem garantias plenas de defesa. Sua mensagem é um convite à coragem ética dos operadores do direito. Defender a democracia hoje significa combater práticas que convertem tribunais em palcos de perseguição.
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal, ao anular processos oriundos da Operação Lava Jato claramente marcados pela parcialidade, seguiu – talvez sem intenção direta – o caminho ético apontado por Francisco. Mas ainda há muito o que avançar. A Justiça, corrompida pela Lava Jato, precisa ser resgatada à sua condição originária: lugar de equilíbrio, onde se pesa cuidadosamente cada prova e argumento.
Francisco deixa aos defensores da democracia uma tarefa essencial: zelar para que o direito jamais sirva para cometer crueldades. Seu legado é uma advertência permanente, um farol que guia advogados, juízes e promotores rumo à verdadeira justiça, aquela que protege, liberta e dignifica. Que esse compromisso se renove diariamente nas cortes e escritórios, pois é nele que repousa a esperança de um mundo mais justo e humano.
“É preciso detectar e neutralizar o lawfare”
- Papa Francisco
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: